domingo, 16 de março de 2014

A filosofia do Islã


Alcorão ou Corão (em árabe: القرآن, transl. al-Qurʾān, lit. "a recitação") é o livro sagrado do Islã.



 
Alcorão ou Corão
(em árabe: القرآن, transl. al-Qurʾān, lit. "a recitação")
é o livro sagrado do Islã.

2. A filosofia do Islã

A doutrina Islã possui três princípios, ou artigos de fé, indissociáveis:

• o credo: trata-se de uma revelação divina e de uma religião monoteísta;

• os deveres religiosos: estão resumidos em cinco, sendo considerados os pilares da revelação;

• as relações pessoais: são princípios éticos e políticos ensinados pelo islamismo.

2.1 - O credo Islã

Sempre se julga mal uma religião quando se toma como ponto de partida exclusivo suas crenças pessoais, porque então é difícil justificar-se um sentimento de parcialidade na apreciação dos princípios. [...] Se nos reportarmos ao meio onde ela surgiu, aí encontramos quase sempre, se não uma justificativa completa, ao menos uma razão de ser. É necessário, sobretudo, penetrar-se no pensamento inicial do fundador e dos motivos que o guiaram. Longe de nós a intenção de absolver Maomé de todas as suas faltas, nem sua religião de todos os erros que chocam o mais vulgar bom-senso. Mas a bem da verdade, devemos dizer que também seria pouco lógico julgar essa religião conforme o que dela faz o fanatismo, como o seria julgar o Cristianismo segundo a maneira por que alguns cristãos o praticam. É bem certo que, se os mulçumanos seguissem em espírito o Alcorão, que o Profeta lhes deu por guia, seriam, sob muitos aspectos, completamente diferentes do que são. 2  Para apreciar a obra de Maomé é preciso remontar à sua fonte, conhecer o homem e o povo ao qual ele se havia dado a missão de regenerar, e só então se compreende que, para o meio onde ele vivia, seu código religioso era um progresso real. 3

A revelação divina, base da crença islâmica, está resumida no seguinte artigo de fé: Não há um Deus senão Alá, e Maomé é seu Profeta. Esta coluna mestra da religião islâmica é a unicidade de Allah, chamada de Tauhid. A crença na unicidade de Deus é entendida sob três enfoques: a) unicidade do Criador ou Arububia. Significa que Alá criou e mantém o universo, coisas e seres, pois Ele é o Senhor de tudo e de todos; b) unicidade da divindade ou Tahid al uluhia. Expressa que Alá é o Único que devemos adorar e somente a Ele devemos dirigir nossas súplicas, dispensando intermediários entre Ele e os homens; c) unicidade dos nomes e atributos de Alá ou Tauhid al assmá ua sifát. Esclarece que a Alá pertencem todos os nomes e atributos da perfeição, razão suficiente para nos submetermos totalmente a Ele, pois é “Allah, o Único!

O Absoluto! Jamais gerou ou foi gerado. E nada é comparável a Ele’’ (Alcorão, surata 112). 21

O credo em Deus único produz, como conseqüência, a crença na existência de anjos que, nos livros sagrados do Islamismo, são entendidos como mensageiros divinos que executam as determinações de Alá. Esses mensageiros são feitos de luz, possuem mãos, pés e asas. Incansáveis, jamais agridem; possuem poderes sobrenaturais, são extremamente virtuosos, têm várias ocupações e podem assumir a forma humana. 22

Quando revestidos de corpo físico, os mensageiros divinos se revelam como pessoas especiais, portadoras de uma missão divina, apesar de possuírem corpos de carne e ossos, de sentirem o que nós sentimos, de adoecerem e morrerem, como qualquer um de nós. 23

O credo islâmico aceita e venera alguns livros, considerados sagrados, porque foram revelados por Alá, por meio dos mensageiros que assumiram a forma física. Os principais livros sagrados são: Torah, de Moisés; Salmos, de Davi; Evangelho, de Jesus e Alcorão, o último dos livros santos, o qual permanece inalterado. Abraão, Moisés, Jesus e Maomé são mensageiros divinos, entre os vinte e cinco citados no Corão. 23

A crença no Dia do Juízo Final é outro artigo de fé islâmica. Acredita-se que, após a morte, seremos ressuscitados, e, nesse dia, todos os nossos atos serão julgados por Alá. A justiça, então, será feita e quem tiver seguido o caminho revelado por Alá, terá o paraíso como morada eterna. As pessoas que preferiram atender os desejos inferiores e os caprichos terão o inferno como morada na eternidade. Os mortos aguardam, dormindo, o dia do julgamento.

A crença na predestinação, outro artigo de fé, significa ter convicção que Alá é o Senhor e que Ele colocou tudo no seu devido lugar, criando a felicidade e o sofrimento. Dessa forma, o tempo da vida de cada um está nas mãos de Alá. O homem possui livre-arbítrio, mas não pode sair do círculo permitido por Ele; deve esforçar-se para conseguir de maneira lícita o que deseja para mudar uma situação, não devendo acomodar-se e nem culpar o destino pela sorte ou azar. 24

O céu e o inferno estão descritos com detalhes no Corão, e dão margem a diferentes tipos de interpretação muçulmana. 11

Uma das críticas mais severas do Islamismo contra o Cristianismo é que, por este centralizar a palavra de Deus em Jesus (“E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós’’ – João 1:14), a religião cristã teria produzido uma ruptura na essência do monoteísmo. Tal fato não aconteceu com o Islamismo, já que o Corão é, literalmente, a palavra de Deus. Na verdade, são equívocos de interpretação, pois, se no Cristianismo a palavra de Deus está centralizada numa pessoa (Jesus), no Islamismo está num livro (Alcorão). Sendo assim, os muçulmanos não consideram correto comparar Jesus com Maomé e a Bíblia com o Corão. Aceitam que há um paralelo entre o Evangelho e o Corão, porque ambos são de origem divina, revelados por mensageiros de Alá.

Consideram a Bíblia, como um todo, mais como um texto histórico, ao passo que o Corão é “incriado e existe de sempre’’.

É ofensivo chamar os seguidores do Islã de maometanos. Eles se dizem muçulmanos, ou seguidores do Islã, uma vez que Maomé foi apenas um profeta (o maior deles), não criou uma religião, mas revelou a religião verdadeira. 12

2.2 - Os deveres religiosos

São práticas, resumidas em cinco pilares que se complementam e devem ser aceitas integralmente pelo mulçumano. Significa dizer que aquele que nega parcial ou totalmente um pilar, não é considerado muçulmano. 21 Tais práticas podem ser assim resumidas:

Credo ou Shahada: também chamado de testemunho, está resumido na expressão: “Não há Deus senão Alá e Maomé é seu Profeta’’. Este testemunho deve ser repetido pelos fiéis, várias vezes durante o dia, e também deve ser proclamado do alto dos minaretes na hora de cada oração. Este ato de fé encontra-se registrado nas paredes das mesquitas. O Shahada é porta de entrada para o Islam, considerado a chave do paraíso. 25 É o primeiro testemunho que deve ser sussurrado aos ouvidos do recém-nascido e o último que o moribundo ouve. 13 A crença islâmica é clara, simples, indo ao encontro do filtra (conhecimento inato do ser humano).

Não aceita acréscimos nem que se retire algo dela. 21

Oração ou Salat: representa a comunicação direta dos homens com Alá, sem intermediários. A oração é proferida por meio de um ritual que envolve movimentos, recitações do Corão e louvores a Alá. Para o muçulmano, quando ele se posiciona para orar e diz Allahu Akbar (Alá é o Maior) ele sai, então, da esfera mundana para o plano superior. 26

As orações são pronunciadas cinco vezes ao dia. Antes de cada oração, propriamente dita, ouve-se o chamado vindo dos minaretes, dando tempo ao crente para, ritualmente, se tornar limpo. Os muçulmanos acreditam que as atividades biológicas tornam as pessoas naturalmente impuras. A purificação consiste em lavar o corpo inteiro em água corrente. Às vezes é permitido lavar apenas o rosto e as mãos. É comum a existência de casas de banhos próximas às mesquitas.

A maioria das orações islâmicas são fórmulas fixas, embora haja também a oração espontânea, na qual o fiel diz a Deus algo pessoal. As preces são acompanhadas de gestos específicos. Os gestos têm mais valor do que as palavras. As cinco orações diárias podem ser ditas em qualquer lugar, desde que a pessoa se ajoelhe e ore voltada para Meca.

É recomendável que o fiel faça uma das preces diárias na mesquita, ou que aí ore, pelo menos, uma vez por semana. É especialmente relevante a oração de sexta-feira, ao meio-dia, porque nesta prática religiosa está incluído um sermão.

Os que comparecem às mesquitas devem estar respeitosamente vestidos, tirar os sapatos antes de entrar e acompanhar os gestos de quem dirige as orações, de forma ordenada e disciplinada. O líder das orações posiciona-se à frente do grupo, direcionado para Meca, de costas para a congregação. Somente os homens oram no salão principal da mesquita, reservando-se as galerias para as mulheres, as quais podem, também, ficar escondidas atrás de uma cortina, existente no fundo do templo. Qualquer homem adulto muçulmano pode ser um imã, ou dirigente das preces. 14

Caridade ou Zakat: trata-se de uma taxa, ou imposto formal, obrigatório, fixado em 2,5%, sobre a riqueza e a propriedade do muçulmano, 16 que este deve doar à mesquita.

O Jejum ou Siám: é o quarto dever islâmico. O Corão proíbe aos muçulmanos de comerem carne de porco, de cachorro, raposa, asno — alimentos de uso comum em certa culturas orientais —, por considerarem estes animais impuros. Proíbe também a ingestão de sangue sob qualquer forma. Assim, o abate de animais utilizados na alimentação segue normas ritualísticas, para que não sobre qualquer resíduo de sangue. O vinho e outras bebidas alcoólicas são também proibidas. 9

No nono mês do ano muçulmano — o Ramadã —, mês sagrado do jejum, há um dia de jejum especial. Entre o nascer e o pôr-do-sol desse dia é proibido desenvolver qualquer tipo de atividade. Após o poente, o jejum é suspenso com boa comida e bebida em todas as residências. Em geral, é costume os homens ficarem na mesquita durante a noite especial do Ramadan, ouvindo o Corão, alimentando-se e bebendo festivamente. O Ramadan foi o mês em que Maomé teve a sua primeira revelação. O jejum simboliza o retiro que todo muçulmano deveria fazer, como Maomé fez. 17

Peregrinação a Meca ou Hajj: é o quinto dever religioso. Cabe a todo muçulmano adulto, que tenha condições, realizar peregrinação a Meca, pelo menos uma vez na vida. Para os muçulmanos, Meca e Caaba são o centro do mundo. Não só os fiéis se voltam para Meca quando oram: também as mesquitas são construídas com o eixo mais longo apontando para lá. Os mortos igualmente são enterrados voltados para Meca. Esta cidade é visitada anualmente por cerca de 1,5 milhão de peregrinos, metade dos quais vem de fora da Arábia. A grande mesquita foi reconstruída para receber, atualmente, 600 mil peregrinos. Somente as pessoas que conseguem provar que são muçulmanas entram na cidade santa.

Em Meca, o primeiro rito é caminhar em torno da Caaba sete vezes. Nessa ocasião muitos peregrinos tentam beijar a pedra negra. Outro rito importante acontece entre o meio-dia e o pôr-do-sol, quando os peregrinos se postam no monte Arafat, sem permissão de proteger a cabeça do sol intenso, renovando, assim, o seu pacto com Deus. Segundo a tradição, foi no monte Arafat que Adão e Eva se encontraram de novo, depois de expulsos do jardim do Éden. O ponto máximo dos rituais são os sacrifícios. Em geral, os peregrinos matam um animal (carneiro, boi, bode, camelo) com o propósito de lembrar como Abraão foi obediente a Deus, quando se dispôs a sacrificar seu próprio filho. 18

2.3 - As relações pessoais

São normas relativas à convivência social, ética e política. Tradicionalmente, não há no Islã distinção entre religião e política, entre fé e moral. Todas as obrigações religiosas, morais e sociais estão estabelecidas na sagrada lei muçulmana, a xariá. Trata-se de um conjunto de leis que se fundamentam no Corão, e também no Suna e no haddif. No Corão há instruções fixas e rígidas sobre o governo, a política, a sociedade, a economia, o casamento, a moral, o status da mulher etc.

Se o Corão não fornecer instruções precisas sobre assuntos específicos, os muçulmanos as pesquisam no Suna (muito usado pelos sunitas, uma das divisões islâmicas). Suna são relatos de ações, palavras e reflexões definidas por Maomé e pelos califas. A outra fonte legalista de consulta é o haddit, coletâneas que tratam da vida e das pregações de Maomé.

Essas fontes, inclusive o Corão, se reportam a uma vida em sociedade que não mais existe, surgindo, pois, a necessidade de se fazer adaptações no presente. As adaptações seguem dois princípios: o da similaridade, ou analogia, e o do consenso. O princípio da similaridade ou analogia, procura solucionar um problema atua, a partir de um exemplo análogo existente no Corão ou nas demais fontes. O princípio do consenso parte da afirmação de Maomé de que os fiéis nunca podem concordar, coletivamente, sobre algo errado. Assim, as decisões estabelecidas pelos fiéis, em assembléias específicas, são automaticamente aceitas pelos líderes religiosos (especialistas legais).

Por exemplo: certa ocasião alguns líderes religiosos quiseram proibir a ingestão do café, proibição que foi totalmente rejeitada pelos fiéis numa assembléia convocada para resolver esse assunto (solução foi dada pelo princípio da similaridade).

Uma das subdivisões do movimento Islã, os xiitas, aceitam, além dessa três fontes citadas (Corão, Suna e Haddit), a interpretação dos imans. Já os sunitas não aceitam qualquer interpretação islâmica ocorrida após Maomé.

O Corão não questiona o direito à propriedade privada, mas impõe certas limitações ao acúmulo de riquezas e bens, porque “sendo a riqueza uma tentação, afasta os homens de Deus’’.

As mulheres representam um capítulo à parte nas relações pessoais. Na verdade, no Corão há duas afirmações que se contradizem: a da sura 4:31 e a da sura 2:228, respectivamente expressas assim: “os homens têm autoridade sobre as mulheres, porque Deus os fez superiores a elas’’; “as mulheres devem, por justiça, ter direitos semelhantes àqueles exercidos contra elas’’. Esta última citação dificilmente é utilizada.

É notória a diferença de tratamento que é dado aos homens daquele que as mulheres recebem, sobretudo dentro do casamento. A poligamia é permitida na maioria dos estados muçulmanos, não existindo na Turquia nem na Tunísia. O divórcio é possível, desde que iniciado pelo homem, mas, em geral, é dificultado, pois, segundo Maomé “é a atividade legal menos preferida por Deus’’. Devemos lembrar que o índice de divórcio nos países árabes é o mais alto do mundo.

A circuncisão é obrigatória. A mutilação sexual das mulheres não encontra qualquer referência no Corão. No entanto, é praticada em algums países muçulmanos, notadamente nos do norte da África. A tradição de usar o véu, ou chador, não encontra apoio no Corão, foi uma tradição iniciada pelas mulheres pertencentes a famílias ricas. Entretanto, o Corão orienta os maridos no sentido surrarem as esposas: “Quanto àquelas de quem temes desobediências, deves admoestá-las, enviá-las a uma cama separada e bater nelas.’’ 19 (sura 4)

 

2. KARDEC, Allan. Revista espírita. Jornal de estudos psicológicos. Ano 1866. Tradução de Evandro Noleto Bezerra. Poesias traduzidas por Inaldo Lacerda Lima. Rio de Janeiro: FEB, 2004. Ano 9, agosto de 1866, n.º 8, Item: Maomé e o Islamismo, p. 304-305.

3. KARDEC, Allan. Revista espírita. Jornal de estudos psicológicos. Ano 1866. Tradução de Evandro Noleto Bezerra. Poesias traduzidas por Inaldo Lacerda Lima. Rio de Janeiro: FEB, 2004. Ano 9, agosto de 1866, n.º 8, Item: Maomé e o Islamismo, p. 305.

 

21. ______. Cap. 2. (A crença islâmica) , p. 5.

21. ______. (O Tauhid), p. 5-6.

22. ______. (A crença nos anjos), p. 6.

23. ______. (A crença nos livros. A crença nos mensageiros), p. 6-8.

24. ______. (A crença no juízo final), p. 8-9.

11. HELLEN, V., NOTAKER, H. E GAARDER, J. O livro das religiões. Tra-

dução de Isa Mara Lando. São Paulo: Companhia das Letras, 2000, item:

o credo: p.123-124.

12. ______. p. 125-126.

21. MUNZER, Armed Isbelle. Descobrindo o Islam. Rio de Janeiro: Azaan, 2002.

Cap. 2 (A crença islâmica) , p. 5.

21. ______. (O Tauhid), p. 5-6

25. ______. Cap. 3 (As obrigações do Islam), p. 13.

19. HELLEN, V., NOTAKER, H. E GAARDER, J. O livro das religiões. Tradução de Isa Mara Lando. São Paulo: Companhia das Letras, 2000, item: relações humanas – ética e política, p. 130-134.

 

 

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