quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Tema: Maçonaria


Tema: Maçonaria




“A Maçonaria paulista pode ser comparada à uma árvore frondosa, cujos galhos se estendem por todo o Estado de São Paulo e que tem suas raízes plantadas no solo fecundo de Porto Feliz”. É assim que o advogado Reinaldo Crocco Júnior, venerável mestre (2002-2003) (equivalente a presidente) da Loja Inteligência de Araritaguaba costuma definir, em suas palestras, o trabalho dessa secular e misteriosa instituição. Crocco fala com conhecimento de causa. Maçom há quase 20 anos, ele pesquisou em várias parte do Brasil a história da Maçonaria, em especial a loja de Porto Feliz, hoje reconhecida como a primeira do Estado de São Paulo. Foi aqui, por exemplo, que foi iniciado Regente Feijó (em 1831, segundo o historiador Brasil Bandecchi). Esta e outras histórias, Crocco conta nesta entrevista concedida à Revista Viu!, na qual ele também destaca o que é verdade e mentira sobre a irmandade dos Maçons.

A Loja Maçônica de Porto Feliz é a mais antiga do Estado?

É a mais antiga do Estado de São Paulo, comprovadamente. Fundada aqui em Porto Feliz em 19 de agosto de 1831, quando lojas maçônicas existiam em Mato Grosso, Rio de Janeiro e alguns estados do Nordeste. Na província de São Paulo, que englobava grande parte do Paraná (inclusive Curitiba), não existiam lojas maçônicas.





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Quem fundou?

Foi um oficial do exército brasileiro, chamado João Batista Lobo de Oliveira. Ele era matogrossense, passou pelo Rio de Janeiro. Lá houve um movimento maçônico em 1827 e começaram, então, a determinar a criação de lojas em outros estados, no país. Esse oficial veio para Porto Feliz com um negociante chamado Luiz Luciano Pinto, e aqui eles encontraram João Gaudie Lei, que era comerciante. Os três criaram a loja, chamada Inteligência de Porto Feliz.

Então, desde daquela época já tinha este nome?

É. Daí a loja abateu colunas (fechar, encerrar as atividades) em três oportunidades. Tenho aqui as datas: em 1835; depois, na década de 50, também parou. Voltou em 1983, mas sempre com o mesmo nome Inteligência. Quer dizer, em Porto Feliz nunca foi fundada outra loja maçônica. Sempre foram reerguidas as colunas da loja antiga... A Inteligência fundou, inclusive, em São Paulo, a loja Amizade, que é a mais antiga da cidade.

Qual a origem do termo maçom?

É de origem francesa, que significa pedreiro livre, construtor. Na época, os grandes construtores dos grandes templos que existem em toda Europa, eram maçons. Os maçons dominavam a arte da construção. Hoje, como a maçonaria é especulativa, simbólica, a maçom significa construtor social, aquele que constrói o dia-a-dia.

O senhor é um estudioso da maçonaria. O que lhe encanta? Há quanto tempo é maçom?

Já vai fazer 20 anos que faço parte. O que me encanta é a filosofia. Muita gente pensa que a maçonaria é uma religião. Não é. Também não é uma sociedade secreta. É uma sociedade de finalidade filantrópica, mas o trabalho principal, a essência, é o ser humano. Ela entende que se você não melhorar a si próprio, você não vai melhorar o mundo. Todos nós alvejamos um mundo melhor. Esse é um propósito universal. Mas, como construir esse mundo se a gente não melhorar? O que você errou ontem, não erre hoje. Aperfeiçoe-se.

Quais os trabalhos que vocês desenvolvem lá dentro, buscando esse aperfeiçoamento interno?

Nas reuniões da maçonaria, todas às terças-feiras, a gente tem por lema praticar virtudes. Cavar masmorras ao vício. Quer dizer, tudo o que você faz de ruim, convivendo com pessoas que sabem dizer se aquilo é bom ou não, você vai se aperfeiçoando. E a maçonaria também não deixa de ter seu lado filantrópico. Ela ajuda muitas pessoas e instituições, só que não divulga. Então, vivendo nesse clima, nesse ambiente saudável, você automaticamente está melhorando a si próprio e a quem convive com você.

Mas têm coisas da maçonaria que não se pode dizer, não é?

É, muita gente comenta sobre os segredos da maçonaria. Na verdade, ela tem uns sinais, uns toques, que só o maçom conhece. Por exemplo, não sei falar o idioma árabe, mas se eu for a qualquer país onde o idioma seja árabe, me identifico como maçom, com alguns sinais, com alguns toques. Em qualquer país do mundo eu me identifico como maçom. Esse é o tal segredo, entre aspas, que só os maçons conhecem. Mas a maçonaria, de um modo geral, já foi muito mais fechada do que é hoje. Hoje é mais aberta, nós fazemos aqui em Porto Feliz o que chamamos de sessões abertas. São palestras que a loja promove, trazendo pessoas importantes e abertas para quem quiser participar...

O senhor já conseguiu identificar alguém pelos códigos maçons?

Identificar já. Muitas vezes me identifico e meus irmãos se identificam comigo. Isso é comum. Pode chegar três, quatro pessoas aqui em casa e uma delas se identificar comigo que ninguém vai perceber. Essa é a forma de se saber que existe dois maçons num determinado local. Agora, já existiu um caso aqui em PF de um irmão nosso, que assaltado em São Paulo no começo da noite. Ele ficou numa situação desesperadora, perdeu todo dinheiro e documentos. Então, pediu socorro. Posicionou-se em uma avenida, fazendo determinados sinais de socorro e imediatamente começaram a parar dois, três, quatro veículos, que vieram ver o que estava acontecendo. Ele contou o que estava ocorrendo e foi providenciado o seu retorno a Porto Feliz.

Antigamente, isso era muito mais fechado. Inclusive não se sabia nem quem era maçom...

Era. Nos tempos mais antigos, os maçons nem nomes revelavam. Todos tinham apelidos, para que não fossem identificados. Eram identificados pelos toques, sinais, usam capuzes até. Reuniam-se em cavernas, eram escondidos. Isso porque havia muita perseguição, não só da igreja da época, como da própria política do momento. Então, havia os apelidos. Por exemplo, o fundador da loja de Porto Feliz, João Batista Lobo de Oliveira, tinha o apelido de “Trajano”. O Luiz Luciano Pinto era o “Bruce” e o João Gaudie Lei era o “Voltaire”. Isso era uma forma de camuflagem para fugir às perseguições.

Porque não pode entrar mulher na maçonaria?

Ela é antigüíssima, tradicionalista e vem da época da sociedade paternalista, onde o homem mandava. Hoje, se mantém a tradição, mas já existem lojas maçônicas de mulheres, inclusive aqui em São Paulo. Mas, a rigor, não existe nada que impeça, até poderia ser uma loja mista. Mas, há outras razões. É tradição, costume antigo. Mas a maçonaria respeita muito as mulheres. Aqui em Porto Feliz, a própria construção do templo da Loja Inteligência é um trabalho do grupo Acácia, formado pelas mulheres dos maçons. Elas é que trabalharam, lutaram e praticamente construíram o templo em que está hoje a loja.

Parece que o templo tem algumas características, não tem janela...

Não é que não tenha janela. O prédio da loja tem janela, tem porta, comum. O templo é quase que subterrâneo, escondido. Porque ali se reúnem os maçons. Nas sessões chamadas maçônicas, só se reúnem ali os maçons. E, por que é fechado? Para que as pessoas que não são membros não participem das reuniões, até em função da mitualística maçônica, dos sinais que se usam lá dentro, para o aperfeiçoamento dos maçons (que são chamados irmãos). São, enfim, procedimentos, que só interessam aos maçons. Por isso que o templo é fechado.

É verdade que os maçons se ajudam em momentos de dificuldade?

O maçom sempre estende a mão, não só a outro maçom, mas como a qualquer outro necessitado. A maçonaria ampara as pessoas que necessitam. É evidente que se houver um maçom que necessite de alguma ajuda, será ajudado. Mas essa história de que os maçons são ricos, isso é conversa. Não existe.



Não há a exigência de uma determinada condição financeira para ser maçom?

Não, a única condição para ser maçom é que se acredite em Deus. A maçonaria não aceita ateus. Ela não é uma religião, é uma sociedade filantrópica, acredita na existência de Deus e na sobrevivência da alma, do espírito, em uma vida após a morte. Então, as pessoas que não crêem em Deus e não crêem numa vida após a morte, elas não podem entrar na maçonaria. Deus para a maçonaria é um conceito universal, não é o Deus dos católicos, nem o dos evangélicos. É Deus. A maçonaria o chama de Grande Arquiteto do Universo.

Vocês acreditam em reencarnação?

Acreditamos na vida do espírito após a morte. A reencarnação, propriamente dita, depende da filosofia religiosa de cada um. A maçonaria acredita que a vida não acaba aqui. Você morre, seu corpo é sepultado, mas o espírito continua porque é eterno. Quanto à reencarnação, eu propriamente, acredito. Professo a religião espírita.

Dizem que alguns maçons famosos foram iniciados em Porto Feliz?

O professor Brazil Bandecchi sustenta que, em 1831, o padre Diogo Antonio Feijó, o Regente Feijó, foi iniciado maçom em Porto Feliz, na loja Inteligência. Ele teve uma desavença política no RJ, veio para SP, tinha o cargo semelhante de ministro da justiça no tempo do Brasil Imperial. Para fugir do burburinho político, ele veio descansar em Itu, da onde foi trazido para cá. Daqui ele voltou a SP onde filiou-se à loja Amizade, onde uns dizem que ele chegou a ser segundo vigilante (seria o cargo de segundo vice-presidente da loja). Outros dizem que ele chegou a ser Venerável Mestre (cargo de presidente da loja). É um fato histórico dentro de Porto Feliz que muita gente não conhece.



Não há também uma história de quem D. Pedro também esteve aqui?

D. Pedro II, em 1846, passou por Porto Feliz e seguiu para Capivari. Não consta que ele tivesse visitado a loja em Porto Feliz, mas em Capivari, na loja Integridade. Existe até hoje a cadeira onde ele se sentou, preservada.

Ouve-se, por exemplo, falar de rituais com sangue, que é usado para escrever. Existe isso?

Dizem isso. Alguns comentam. Mas não existe nada disso. Pelo contrário, a maçonaria é uma sociedade que mantém suas tradições, mas respeita o ser humano, busca o aperfeiçoamento do homem. Não existe e nunca existiu nenhum ritual desse tipo. Isso é crendice popular. Coisa que o povo criou. c. Nunca existiu nada disso na história da maçonaria. O fato deles se esconderem na época era em razão da perseguição da igreja católica e perseguição política.

E a história do bode?

Na verdade, o bode foi até adotado pela maçonaria como um lema. O bode vem de uma expressão “bhody”, que significa ser iluminado. O que hoje se chama vulgarmente de “bode”, com aquela conotação do chifre, de que a maçonaria seria coisa do diabo. Mas isso absolutamente não existe. É uma instituição que prega a existência de Deus. Se você for convidado para integrar a maçonaria, mas disser que não acredita em Deus, sinto muito mas não poderá ser aceito.

Quando a pessoa ingressa na maçonaria há algum ritual?

Existe uma cerimônia de iniciação, fechada, restrita. É uma cerimônia para mostrar a diferença entre o homem maçom e o homem profano, o que ele passa a representar para a sociedade a partir dali. É uma ritualística fechada, só para os maçons, onde a finalidade é essa: mostrar o significado da vida, que é passageira; ou você faz algo ou não faz



Há proposta de se abrir mais a maçonaria, até para que se deixe de alimentar todo esse folclore?

As reuniões maçônicas são e sempre serão só para os maçons. Isso, é claro, desperta a curiosidade. “O que será que eles estão fazendo?”. Mas, nada de extraordinário, nada de ilegal, nada de sacrifício de animal ou humano. Não se bate em Jesus Cristo como muita gente pensa. Pelo contrário, os maçons se reúnem entre discutirem entre si para treinarem sua formas de identificação.

Quais são os maçons famosos da história?

Há muitos. Os essênios, povo entre os quais Jesus teria vivido a maior parte da vida dele, eram iniciados nos mistérios da maçonaria. Muitos autores dizem que Jesus foi e é o maior de todos os maçons. Muitos historiadores dizem isso, mas não há comprovação, claro. Na história do Brasil, maçons ilustres como Rui Barbosa, Jânio Quadros, José Bonifácio, o imperador D. Pedro I (D. Pedro II não foi maçom), que chegou ao cargo maior, de grão-mestre.

A maçonaria também tem uma participação na historia do Brasil, não é?



Os grandes vultos da história do Brasil, quase todos eles, são maçons. E os grande feitos da história do Brasil, entre eles a Proclamação da República, da Independência, a libertação dos escravos, se deve à maçonaria. No dia 20 de agosto é comemorado como Dia do Maçom, porque a Independência foi proclamada dentro de uma loja maçônica no Rio de Janeiro. O brado de D. Pedro, às margens do riacho Ipiranga, é um fato histórico. Ele gritou “Independência ou Morte” porque ele tinha todo um retaguarda política que lhe dava sustentação para garantir a independência do Brasil. A verdadeira independência foi assegurada e proclamada dentro de uma loja maçônica.

Hoje são quantos os maçons de Porto Feliz?

Maçons ativos, que freqüentam a loja, temos 33. Mas, temos perto de 50, 60 maçons entre os que estão em atividade e os que estão afastados, mas podem voltar a qualquer momento. É importante salientar também e muitos já me perguntaram: “Se um dia você quiser sair da maçonaria não vão matá-lo?” (risos) De jeito nenhum. Não há nenhum impedimento. O maçom é livre. Você entra se você quiser, desde que convidado. E desde que preencha os requisitos, entre os quais: acreditar em Deus, ser uma pessoa que não tenha um passado pouco recomendável.

Se, por exemplo, a pessoa tiver um processo não pode ser maçom?

Depende do processo. Você pode ter sido processado e não ter tido nenhuma responsabilidade. É feito uma avaliação para saber o porque desse processo. Busca-se a verdade sempre. Aliás, é um dos lemas da maçonaria, a busca permanente da verdade.

Muita gente também confunde Maçonaria com Rotary Clube, não é?



É, existe essa confusão. O Rotary é uma instituição de uma importância muito grande para a sociedade. A única distinção que existiria, além dos toques e sinais que só os maçons conhecem, seria de que o Rotary é uma sociedade mais aberta, faz filantropia, é composto por pessoas de dignidade a toda prova. E existem muitos maçons no Rotary e rotarianos na maçonaria. São instituições que se confundem e tem objetivos praticamente comuns.

Existe caso de expulsão?

Existe, claro, como em toda sociedade. O maçom que não cumpre seus deveres maçônicos, que não é exemplo de 24h de dignidade, decência e bom comportamento, pode ser muito bem expulso.

O que é um pecado capital para o maçom?

Ser desonesto, não ser cumpridor de seus deveres, não ser um bom marido, não ser bom pai, não ser um cidadão que realmente constrói a sociedade, ser um bandido, se tornar um criminoso qualquer, se tornar um cidadão de má índole. Isso não faz parte dos princípios da maçonaria. Nem a pessoa que parte para esse lado vai permanecer lá, ela não vai se sentir bem. Automaticamente acaba saindo.

A atividade da maçonaria hoje está centrada em alguma entidade filantrópica?

A maçonaria sempre que chamada ela tem ajudado a todos. Tem alguns maçons fazendo parte da diretoria, trabalhando e fazendo até um trabalho muito bonito na Santa Casa. Mas, de modo geral, todos que pedem o auxílio da maçonaria tem recebido, indistintamente.



Revista Viu!


 

Este artigo veio de .: A.:R.:L.:S.: Inteligencia nº 3924 :.

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