Loja Maçônica Branca Dias. |
Sobre os Primórdios da Maçonaria
Como estudiosos da filosofia, sabemos, há muito, que Vico é o pai da “Filosofia da História”, estereotipando-a com princípios de uma ciência nova. Sabemos mais que a “Filosofia da História” é, ainda agora, dominada por conceitos metafísicos, que dificultam a compreensão dos leigos no assunto. Vejam bem: falamos em conceitos metafísicos e não em “Conceitos Invencionistas”. O verdadeiro historiador não inventa nada!
Aliás, a “Filosofia da História” surge já no século XVIII, quando se chegou à conclusão de que, do conjunto dos fatos históricos, se poderia tirar uma lei geral do desenvolvimento da humanidade. Daí porque, pensamos nós, os historiadores maçônicos podem mesclar seus trabalhos com considerações gerais acerca da marcha evolutiva dos acontecimentos maçônicos.
Isto, porém, não significa que alguém tenha o direito de sair por aí “fabricando” uma história que lhe saia da imaginação, buscando dar-lhe contornos de História verdadeira. De nossa parte, fazemos questão de gritar aos quatro ventos que não somos e nem temos pretensões de chegar a ser historiador. Somos, isto sim, aqueles pesquisadores que se interessam pela verdade histórica. Se a História não aceita invencionices, a filosofia não admite mentiras. Desculpem-nos a força do termo.
O certo é que, se dizemos que a Maçonaria nasceu com os Essênios, ou com os Templários, ou com os Collegia Fabrorum, estaremos afirmando algo que não podemos provar, logo, podemos estar difundindo alguma coisa que seja pura invencionice. Se a História e a “Filosofia da História” não admitem inverdades, o que dizer então da Maçonaria?
O que desejamos deixar bem claro é que só pode-remos falar em Maçonaria Antiga, quando pudermos escudar-nos em documentos fidedignos. O mais antigo documento que se conhece da chamada Maçonaria Antiga, ou Operativa, ou de Ofício é o Poema Régio, que é de 1390, portanto, século XIV. Tudo o que se disser anterior a essa data não passa de pressuposição. É mister que nos acautelemos com as invencionices de quem não teve ou não tem coragem de investigar, de buscar a verdade em documentos que mereçam fé. Há muita gente que vai atrás do “ouvi dizer”. A verdade é que ainda há escritores Maçons que propagam que a “origem da Maçonaria” se perde nas “névoas da antigüidade”.
Nenhum pesquisador honesto embarca na canoa furada daqueles que teimam em afirmar que a Sublime Instituição existe há milhares de anos. Só os “inocentes” podem acreditar na absurda afirmação de Anderson, no seu primeiro livro das “Constituições”, de que – Adão – nosso primeiro pai, criado à imagem e semelhança de Deus, devia ter possuído as ciências liberais, principalmente a geometria, escritas em seu coração. Baseado nisto, ainda hoje, há quem ensine que a Maçonaria tem seu início no Paraíso terrestre.
Jean Palou reconhece que as origens da Maçonaria estão muito longe de serem claras e não poderia ser de outra forma, e acrescenta: “Anderson faz remontar a Franco-Maçonaria a Adão, sem dúvida por não poder ir mais longe e por lhe faltar a ousadia de atribuí-la ao próprio Jeová”.
É evidente que a falta de documentos e registros dignos de crédito, envolve a Maçonaria numa penumbra histórica, o que faz com que os fantasistas, talvez pensando em engrandecê-la, inventem as histórias, sem pé nem cabeça, sobre os primórdios de sua existência. Há aqueles que ensinam que ela teve início na Mesopotâmia, outros confundem os movimentos religiosos do Egito e dos Caldeus como sendo trabalhos maçônicos. Há escritores que afirmam ser o Templo de Salomão o berço da Maçonaria.
O que existe de verdade é que a Maçonaria adota princípios e conteúdos filosóficos milenares, que foram adotados por instituições como as “Guildas” (na Inglaterra), Compagnonnage (na França) e Steinmetzen (na Alemanha). O que a Maçonaria fez foi adotar todos aqueles sadios princípios que eram abraçados por instituições que existiram muito antes da formação de núcleos de trabalho que passaram à história como o nome de Maçonaria Operativa ou de Ofício.
O Ir.·. Darley Worm, em excelente trabalho intitulado “Nuvens Preocupantes nos Horizontes da Maçonaria”, assinala com muita propriedade que “Para obtermos a idade da Maçonaria, temos de distinguir a Instituição, dos seus conteúdos, estes sim, milenares, conforme alguns autores; eternos, segundo outros... Os conteúdos que a Maçonaria assumiu já eram milenares quando Salomão nasceu na casa de Davi e é puro delírio febril alguns historiadores falarem em Maçonaria Arcaica, Antiga ou Arqueológica. Os conteúdos com que lidamos hoje, já eram veneráveis para as Escolas de Mistérios (Elêusis, etc.), para os teosofistas, para os rosacruzes, para os gnósticos, para os alquimistas, para os Collegia Fabrorum; ainda que tenham um grande número de pontos em comum. Mas nem Pitágoras, nem Jesus, nem Platão, etc., eram Maçons, pela simples razão de que a Maçonaria (como Instituição) nem havia sido criada”.
De algum tempo para cá, após a criação da Loja de Pesquisas Maçônicas “Brasil”, de Londrina, têm surgido historiadores e pesquisadores Maçons que se têm dedicado, de corpo e alma, como lá se diz, à busca de documentos primários ou secundários que possam trazer luzes aos mistérios que envolvem a Maçonaria primitiva. Frederico Guilherme Costa, historiador maçônico de primeira água, no seu livro “Maçonaria na Universidade- 2”, diz que “O conjunto de organizações de Ofício, principalmente medievais, é conhecido com o nome de Maçonaria Operativa ou de Ofício. Sempre existiram, no passado remoto, associações de operários ligados à arte de construir, mas não eram organizadas na forma das futuras corporações com sentido corporativista. Alguns autores sustentam o ponto de vista de que a primeira associação organizada por rígidos estatutos foram as dos Collegia Fabrorum romanas, criadas no séc. VI a. C.. Na antiga Roma, os colégios representavam corporações profissionais tidas como fundadas por Numa Pompílio. Apesar de alguma semelhança nos costumes dos colégios com a futura Maçonaria do período operativo, nada nos autoriza a identificação destes colégios com a futura Ordem Maçônica, sequer como paradigma”.
Frederico Guilherme Costa, depois de muita pesquisa, chega à conclusão honesta de que sequer pode tomar os Collegia Fabrorum como modelo, quando se pensa em Maçonaria Operativa. Já outros escritores, não historiadores, afirmam doutoralmente que os Collegia Fabrorum são a base onde repousa a Maçonaria Operativa.
É certo que os historiadores e os pesquisadores cons-cientes se baseiam, acima de tudo, nas Old Charges. As mais citadas pelos bons autores são:
• Manuscrito de Halliwell ou Regius, séc. XIV;
• Manuscrito de Cooke, séc. XV;
• Manuscrito de William Watson, séc. XV;
• Manuscrito de Tew, séc. XVI.
Sabe-se que existem, na Grã-Bretanha, cerca de oitenta e sete manuscritos de Old Charges. Seria, realmente, o Poema Régio, também chamado de “Manuscrito de Hallliwell” o mais antigo documento da Maçonaria de Ofício? Os melhores autores, aqueles em quem podemos confiar, dizem que sim. Citaremos apenas dois, para não nos alongar em demasia.
Le document authentique le plus ancien date, lui, des annés 1390-1400; c’est le fameux Peème Maçonnique connu également sous les noms de Manuscrit Regius (Royal) ou Manuscrit Halliwell, (du nom de son prémier éditeur)... (Serge Hutin, in “Les Francs Maçons”, Collections Le Temps qui Court – Éditions du Seuil – Paris, p. 53). *
O mais antigo texto é o Regius, manuscrito real, como seu nome o indica conservado no Museu Britânico de Londres. O Regius dataria dos anos 1388-1445. (Jean Palou, “A Franco-Maçonaria Simbólica e Iniciática”, Ed. Pensamento, tradução do francês, edição de 1964, São Paulo, p. 33).
Pode-se supor que as Confrarias Alemãs de Cons-trutores – cujas mais antigas eram a de Magdebourg, criada em 1211, e a de Colônia, criada por volta de 1250 – fossem organizações maçônicas. Vejam que dissemos “pode-se supor”.
É certo que a maior dificuldade que se põe diante do pesquisador honesto é a falta de documentos primários que lhe atestem a existência, em determinada época, da instituição pesquisada. Muitos documentos primários se perderam na poeira inexorável do tempo. Muita coisa deixou de ser escrita porque era preciso estabelecer a lei do silêncio, como um meio de autodefesa das confrarias. Quais seriam os segredos do Maçom operativo? Cremos que eram segredos exclusivamente profissionais, guardados com rigor, sobre a arte de construir. É bem de ver-se que, na Idade Média, só se conhece um tratado de arquitetura, totalmente incompreensível aos que não fossem grandes conhecedores do assunto.
Finalmente, para que se entenda as razões pelas quais muitos documentos desapareceram, vamos transcrever numa tradução nossa o que diz Serge Hutin, no seu “Les Francs-Maçons”, pág. 53:
[A raridade de documentos maçons, anteriores à Maçonaria especulativa, explica-se, sem dúvida, pelo auto-de-fé realizado em 24 de junho de 1719, pelo pastor Desaguliers, então Grão-Mestre da Grande Loja da Inglaterra. Este pastor protestante resolveu destruir todos os documentos que, a seu ver, estivessem impregnados de “papismo” e, assim, dissimular as alterações que ele já havia feito nas regras fundamentais da Maçonaria.].
E quantos e quantos documentos antigos não teriam sido destruídos pela ignorância ou pela má fé? Pre-catemo-nos, todos os que amamos a verdade histórica, com as afirmações e ensinamentos que não se estruturem em documentos que mereçam fé. Não nos esqueçamos, jornalistas, articulistas, escritores, historiadores que verba volant, scripta manent.n
* O documento autêntico mais antigo data dos anos de 1390-1400; é o famoso poema maçônico conhecido igualmente sob os nomes de Manuscrito Regius (Real) ou Manuscrito Halliwell, (nome de seu primeiro editor).
Ir.·. Raimundo Rodrigues
Or.·. de São Paulo – SP
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