A Experiência Ensina
Hans Bachl
O caso ocorreu naquela época quando a nossa loja se compunha de apenas quinze obreiros e o nosso venerável mestre nos lembrava de procurar novos candidatos, pois uma loja precisa de sangue novo, de época, a fim de se renovar em vez de envelhecer e perecer.
Diversos irmãos apresentaram nomes. Entrementes me lembrei de um jovem industrial, que já por diversas vezes me fizera várias perguntas sobre a Maçonaria, sabendo que eu era maçom. Apresentei o nome. E ficaram contentes. Pois se tratava de fato de uma pessoa idônea de mais ou menos quarenta anos, casado já uns dez anos, com dois filhos. Ele protestante e a mulher católica. A religião dos filhos era ignorada. Ganhava o suficiente para não privar a família, caso entrasse na loja.
Destarte, quando encontrei Oscar de Tal uns dias depois, ele, novamente puxando a conversa, me confiou que seu avô era um falecido irmão de uma loja coirmã. Achei que era um bom sinal que o neto estava disposto pertencer à mesma sociedade humanitária. Indiquei-lhe o nome a quem se dirigir. Mas ele queria pertencer à nossa loja, pois da outra não conhecia ninguém. Concordei, mas perguntei ainda se não se tratava de curiosidade apenas.
- Curiosidade, qual nada -, me respondeu. - Somente o diabo é que a minha esposa é contra a Maçonaria. É carola para chuchu, mas ela não vai saber que entrei na Maçonaria. E de vocês não preciso ter medo, pois como me consta ninguém deve falar. Assim ninguém de fora saberá do meu ingresso.
Neste caso, respondi, é melhor o senhor desistir de uma vez para sempre de seu plano. Não pensa mais nisto, o senhor pode ser um homem honesto, prestativo e bom, sem ser membro de uma loja. Mas na nossa loja não pode ingressar.
- Por quê?
- Porque a paz e a harmonia dentro de uma família é-nos sagrada. Se a sua esposa achar que não deve pertencer a uma loja maçônica então melhor resignar.
Passaram algumas semanas, quando encontrei novamente o nosso ex-candidato e logo ele começou:
- Meu deus. Não esperava tanta oposição em casa. Minha mulher contou para sogra e as duas vieram com ameaças. Se eu me tornasse maçom, então ela prometeu me abandonar.
- Mas eu não lhe disse de resignar em vista da oposição de sua esposa?
- É verdade, mas tentei e vi que não adianta. Tenho que me calar e enterrar meu sonho.
Passou um ano. Oscar, entrementes, tornara-se sócio do Rotary, útil e sempre a postos, como soube, para qualquer incumbência de servir.
Como se contara, a esposa também não gostara muito da ideia do esposo de entrar nesse clube de serviço. Mas enfim, como outros industriais faziam parte desse clube que a igreja naquele tempo ainda combatia, deu o seu beneplácito e licença para o marido ausentar-se todas as quintas-feiras para tomar parte das reuniões rotarianas. Mas agora estava decidido a deixar o Rotary, pois, como dizia "estava farto de ouvir discursos estéreis e tomar parte de jantares obrigatórios" e entrar na loja se for aceito.
- E a sua esposa? Será que já mudou de ideia?
- É assim. Ela já se acostumou com o Rotary e não fará mais oposição. Ademais, eu tenho mais inclinação para a Maçonaria e já comprei em São Paulo, na minha última viagem, um livro que lhe dá uma ideia o que é a Maçonaria é exatamente aquilo que é o meu pensamento. Disse-me o título do livro que foi escrito para profanos e que conheci.
- Pois, então, sua palavra me basta. Ficarei eu o responsável, o seu padrinho. Mas não depende só de mim. A loja resolverá se poderá ingressar.
Encaminhei os papéis. O candidato após o tempo legal foi aprovado no escrutínio. Chegou o dia de iniciação. O neófito passou pelas provas ritualísticas com coragem e recebeu como prêmio avental branco e luvas alvas mais um par, para ser entregue à sua consorte, como deferência da loja a excelentíssima esposa do novo irmão que doravante é considerada irmã.
Na próxima sessão o novo irmão aprendiz não compareceu, na segunda reunião brilhou por ausência. Qual teria sido o motivo? O venerável me incumbiu de falar com o irmão neófito e indagar sobre o motivo de suas faltas.
Qual a minha surpresa quando ele me confessara seu fracasso em casa.
- Então você estava mentindo quando me afirmou não ter mais dificuldades e sua esposa estaria conformada.
- É verdade, desculpe-me, mas era tão grande meu desejo de pertencer à Maçonaria que arrisquei tudo. Mas ela descobriu logo em minha escrivaninha o ritual, avental e luvas, que tinha escondido em uma pasta. Nem teve coragem de entregar o par de luvas brancas destinada à sua consorte. E ela novamente ameaçou de me deixar dizendo:
- Ou você devolve tudo ou eu me vou com as crianças. Pode escolher; nunca permitiria que você pertencesse a essa sociedade "diabólica". - Que é que vou fazer agora?
- Em primeiro lugar, você com sua mentira colocou-me em maus lençóis perante minha loja. Em segundo lugar, você como mentiroso é mesmo indigno de pertencer a nós. Você foi apenas um curioso que queria conhecer os segredos da Maçonaria. Mas sei que você não entendeu patavina, devolva tudo. Fica tranquilo que nada te acontece. Mas a tua própria consciência vai te julgar.
Deixei-o pensativo e envergonhado no seu escritório particular onde mantivemos essa nossa conversa.
E eu pensei com meus botões que parte da culpa cabe a mim mesmo, porque acreditei piamente na "conversa" dele. E outra parcela cabia também aos sindicantes que apresentaram as melhores referências, tendo copiado um do outro, sem na realidade colher informações seguras, não somente sobre a parte financeira, como também sobre as condições familiares e morais do candidato.
Nunca mais se repetiu em nossa loja um caso idêntico. A experiência ensina!
Mais barato, porém, é tomar este exemplo como advertência para não cair no mesmo erro.
Fonte:
1. Nos Bastidores da Maçonaria, Memórias de um Secretário.
Data do texto: 13/03/2012.
Loja Amizade ao Cruzeiro do Sul 4 Grande Loja de Santa Catarina.
Rito: Rito Escocês Antigo e Aceito
Local: Joinville.
Grau do Texto: Aprendiz Maçom.
Área de Estudo: Intolerância, Maçonaria, Moral.
Sinopse do autor: M. Claudius, maçom de nacionalidade brasileira. Hans Bachl.
P.S.
A peça de arquitetura não é de minha lavra, pertence a um irmão de Joinville e que a escreveu na década de 1950.
Naquele tempo já era assim.
Colhemos hoje o que se plantou desde então.
T\ F\ A\,
Charles Evaldo Boller
14/03/2012 20:09.
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