sábado, 2 de outubro de 2010

SEISCENTOS ANOS DE RITUAL NA ORDEM

SEISCENTOS ANOS DE RITUAL NA ORDEM
Por: Harry Carr.

PRÓLOGO


Irmãos, muitos de vocês devem saber que eu viajo longas distâncias no curso de
minhas obrigações com conferências e quanto mais longe vou, mais abismado fico ao ver que muitos Irmãos acreditam, muito sinceramente, que o nosso ritual maçônico desceu do céu, diretamente das mãos do Rei Salomão. Eles estão muito seguros de que foi em Inglês, é claro, porque é a única língua que falam lá em cima. Eles estão igualmente seguros que tudo foi lavrado em dois tabletes de pedra, para que, os céus proíbem, nenhuma simples palavra, pudesse ser alterada; e muitos deles acreditam que o Rei Salomão, na sua própria Loja, praticava o mesmo ritual que eles praticam na deles.
Mas não foi dessa maneira e, nesta noite tentarei esboçar para vocês a história de
nosso ritual desde seu começo até o ponto em que ele foi virtualmente padronizado, em 1813; mas vocês precisam lembrar, que enquanto eu falo do ritual Inglês também lhes dou a história do seu próprio ritual. Uma coisa vai ser incomum na conversa desta noite. Esta noite nós não teremos nenhum conto de fadas. Cada palavra que eu proferir será baseado em documentos que podem ser provados; e em poucas raras ocasiões quando, apesar de tendo os documentos, não termos a prova completa e perfeita, direi em alto e bom som “nós achamos...” ou “nós acreditamos...”. Então vocês saberão que estaremos, por assim dizer, em terreno incerto — mas darei a vocês o melhor que conheço. E já que uma conversa dessa espécie deve ter um ponto de partida apropriado, vamos começar dizendo que a Maçonaria não começou no Egito, ou Palestina, ou Grécia, ou Roma.

INÍCIO DA ORGANIZAÇÃO PROFISSIONAL MAÇÔNICA

Começou em Londres, Inglaterra, no ano de 1356, uma data muito importante e
começou como resultado de uma boa, antiquada, grande disputa acontecendo em
Londres entre maçons talhadores, os homens que cortavam a pedra e os maçons
assentadores e ajustadores, os homens que na verdade construíam paredes. Os exatos detalhes da rixa não são conhecidos, mas como resultado dessa disputa, 12 hábeis mestres maçons, com alguns homens famosos entre eles, se apresentaram ao prefeito e vereadores na Câmara Municipal de Londres, e com permissão oficial, esboçaram um simples código de regulamentos da profissão.
As palavras de abertura daquele documento, o qual ainda sobrevive, dizem que
aqueles homens tinham se juntado porque seu ofício nunca havia sido regulado dessa forma, como outros ofícios foram. Então aqui, neste documento, nós temos uma garantia oficial que esta foi a primeiríssima tentativa de alguma espécie de organização para os maçons e à medida que o lemos, a primeira regra que eles esboçaram nos dá um indício para demarcar a disputa que eu estava falando. Eles acordaram “Que todo o homem do ofício pode trabalhar em qualquer tarefa concernente ao ramo se ele for perfeitamente habilitado e conhecedor do mesmo”. Irmãos, aquilo era a sabedoria de Salomão! Se você conhecesse o trabalho, você poderia executar o trabalho e ninguém poderia te parar! Se nós tivéssemos tanto bom senso hoje em dia na Inglaterra, quanto melhor nós seríamos.

A organização que foi acertada naquele momento tornou-se, em vinte anos, a
Companhia dos Maçons de Londres (London Masons Company), a primeira guilda de ofício de maçons e um dos ancestrais diretos da nossa Franco Maçonaria de hoje. Esse foi o verdadeiro começo. Mas a Companhia dos Maçons de Londres não era uma loja; era uma guilda de ofício e eu devo despender um bom tempo tentando explicar como as lojas começaram, um problema difícil porque nós não temos registros da efetiva fundação das primeiras lojas operativas.

Em resumo, as guildas eram organizações municipais, grandemente favorecidas
pelas cidades porque ajudavam na administração dos assuntos municipais. Em
Londres, por exemplo, de 1376 em diante, cada ofício elegia dois representantes que se tornavam membros do Conselho Comum, todos juntos formando o governo da cidade.
Mas o ofício maçônico não servia para a organização da cidade. Muito de seu principal trabalho era fora das cidades — os castelos, as abadias, os monastérios, os trabalhos de defesa, os realmente grandes trabalhos de maçonaria estavam sempre longe das cidades.
E nós acreditamos que era nesses lugares, onde não havia outro tipo de organizações de ofício, que os maçons, que eram engajados naqueles trabalhos por anos, se agregaram eles próprios em lojas, imitando guildas, para que tivessem alguma forma de autogoverno no trabalho, enquanto estavam longe de outras formas de controle profissional.
A primeira real informação sobre lojas chega até nós de uma coleção de
documentos que são conhecidos como “Antigas Obrigações” (Old Charges) ou as
“Constituições Manuscritas” da maçonaria, uma coleção maravilhosa. Elas começam com o Manuscrito Regius de 1390; seguido pelo Manuscrito Cooke datado de 1410, e nós temos 130 versões desses documentos correndo através do século dezoito.
A versão mais antiga, o Manuscrito Regius, está em versos rimados e difere em
alguns aspectos dos outros textos, mas em suas formas gerais e conteúdo, eles são muito parecidos. Eles começam com uma Oração de Abertura, Cristã e Trinitária e então continuam com a história da ordem, começando nos tempos da Bíblia e em terras bíblicas e traçam a ascensão da ordem e sua expansão através da Europa até atingir a França e foi então trazida através do canal e finalmente estabelecida na Inglaterra.
Uma história inacreditavelmente ruim; qualquer professor de história cairia morto se fosse desafiado a prová-la; mas os maçons acreditavam nela. Era a sua garantia de respeitabilidade como uma venerável ordem.
Então, depois da história, encontramos os regulamentos, as verdadeiras Obrigações, para mestres, companheiros e aprendizes, incluindo diversas regras de caráter puramente moral, e isso era tudo. Ocasionalmente, o nome de um dos
personagens muda, ou a nomeação de um regulamento será alterada levemente, mas tudo segue o mesmo padrão geral.
Afora essas três seções principais, oração, história e Obrigações, em muitos
deles encontramos poucas palavras as quais indicam os primórdios de uma cerimônia maçônica. Eu devo adicionar que não se pode encontrar todas as informações em um único documento; mas quando nós os estudamos como uma coleção, é possível reconstruir os esboços de uma cerimônia de admissão daqueles dias, a primitiva cerimônia de admissão na ordem.
Nós sabemos que a cerimônia, tal como era, começava com uma oração de
abertura, então havia a “leitura” da história. (Muitos documentos posteriores se
referem a essa “leitura”). Naqueles dias, 99 maçons em 100 não sabiam ler e nós
acreditamos, entretanto, que eles selecionavam seções particulares da história as quais decoravam e recitavam de memória. Ler o texto todo, mesmo que soubessem ler, tomaria muito tempo. Então a segunda parte da cerimônia era a “leitura”.

Então, encontramos a instrução, que aparece regularmente em praticamente todo
documento, usualmente em Latim e diz: “Então um dos sábios segura um livro
(algumas vezes ‘o livro’, algumas vezes a ‘Bíblia’ e algumas vezes a ‘Bíblia Sagrada’) e ele ou eles que serão admitidos colocarão sua mão sobre ele e as seguintes Obrigações serão lidas”. Naquela posição os regulamentos eram lidos ao candidato e tomavam seu compromisso, um simples compromisso de fidelidade ao rei, ao mestre e à ordem, que ele deveria obedecer aos regulamentos e nunca trazer vergonha à ordem. Isto era uma condução direta do compromisso da guilda, a qual era provavelmente a única forma que eles conheciam; sem babados, sem penalidades, um simples juramento de fidelidade ao rei, ao empregador (o mestre) e ao ofício.
Deste ponto em diante, o juramento torna-se coração e essência, o centro crucial
de qualquer cerimônia maçônica. O Regius, que é a primeira das versões a sobreviver, enfatiza isso e vale a pena citar aqui. Depois da leitura das Obrigações do Manuscrito Regius, temos estas palavras: “E todos os pontos acima, a todos eles, ele precisa jurar.
E todos jurarão o mesmo juramento dos maçons, sejam eles determinados, sejam eles relutantes”.
Gostassem ou não, havia apenas uma chave que abriria a porta para dentro da
ordem e esta era o juramento do maçom. A importância, a qual o Regius anexa a ele, nós encontramos repetidas vezes, não nas mesmas palavras, mas a ênfase está sempre lá.
O juramento ou o compromisso é a chave para a cerimônia de admissão.
Assim descrevi para vocês, a mais antiga cerimônia e agora posso justificar o
título de meu trabalho, Seiscentos Anos de Ritual da Ordem. Temos 1356 como a data do início da organização do ofício maçônico e por volta de 1390 a mais antiga prova que indica uma cerimônia de admissão. Devido à diferença, em algum lugar entre essas duas datas, foi onde tudo começou. Isto é quase exatamente 600 anos de história provável e nós podemos provar cada etapa de desenvolvimento dali em diante.
Maçonaria, a arte da construção, começou milhares de anos antes disso, mas,
para os antecedentes de nossa própria Maçonaria, só podemos voltar à linha direta da história que pode ser provada e é 1356, quando realmente começou na Bretanha.
E agora há um outro ponto que precisa ser mencionado antes que eu vá adiante.
Eu tenho falado de um tempo quando havia um grau. Os documentos não dizem que havia somente um grau, eles simplesmente indicam apenas uma cerimônia, nunca mais que uma. Mas acredito que não poderia ser para o aprendiz, ou aprendiz iniciado; deveria ser para o companheiro do ofício, o homem que era completamente treinado.
As Antigas Obrigações não dizem isso, mas há ampla prova externa da qual tiramos essa conclusão. Temos muitas ações judiciais e decisões legais que mostram que nos anos 1400 um aprendiz era um bem pessoal de seu mestre. Um aprendiz era peça de equipamento, que pertencia a seu mestre. Ele podia ser comprado ou vendido da mesma forma que o mestre compraria um cavalo ou uma vaca e sob essas condições, é impossível que um aprendiz tivesse qualquer status na loja. Isso veio muito depois.
Assim se nós pudermos imaginar nós próprios de volta no tempo quando então havia um só grau, ele deveria ser para o maçom completamente treinado, o companheiro da ordem.
Quase 150 anos haveriam passar até que as autoridades e o parlamento
constatassem que talvez um aprendiz fosse na verdade um ser humano também. No inicio dos anos 1500 temos na Inglaterra toda uma coleção de estatutos de trabalho, leis trabalhistas, as quais começam a reconhecer o status de aprendizes e naquele tempo começamos a encontrar evidências de mais de um grau.

De 1598 em diante, temos atas de duas Lojas Escocesas que praticavam dois
graus. Nós voltaremos a isso mais tarde. Antes dessa data não há vestígios de graus, exceto talvez num documento Inglês, o Manuscrito Harleian, nº 2054, datado de 1650, mas acredita-se ser uma cópia de um texto do final dos anos 1500, agora perdido.

Texto traduzido e cedido por:
V.Ir. Paulo Daniel Monteiro

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