terça-feira, 22 de novembro de 2016


Os Cataros – Rebeldes da Religião Institucional

Carlos Antonio Fragoso Guimarães
 
 
“On entend par fanatisme, une folie religieuse, sombre et cruelle; c’est une maladie qui se gagne comme la petite vérole.”
Voltaire
 
 
 
Monumento em forma de megalito às inocentes vítimas cátaras na cidade de Minerve, França.
 
Durante a imersão da Europa, pelo colapso cultural da Civilização Greco-Romana, na estagnação intelectual e sedimentação do poder feudal na Idade Média, apesar dos rígidos padrões de controle do pensamento e da reflexão pela estrutura eclesiástica, surgiram vozes que se levantavam contra o abuso e a arrogância do poder da Religião de Roma, vestígio do intento de Constantino de transformá-la no braço espiritual do Império. Ainda haviam pontos isolados de luzes e de pensamento, que, como centelhas dispersas, vez por outra se juntavam. Estes movimentos conheciam boa parte da tradição espiritual do ocidente, ecos do pensamento de Heráclito, Pitágoras e Platão, e procuravam recuperar a pureza do cristianismo primitivo, sem as pesadas roupagens da ritualística e dos dogmas romanos. Entre as mais famosas dessas correntes rebeldes, predecessoras da Reforma Protestante e do movimento de liberdade de consciência, base da separação moderna entre Igreja e Estado, temos o movimento da Igreja Cátara, que representou de fato – por sua proposta quase socialista, e da responsabilidade individual – uma séria ameaça à hegemonia da Igreja Católica. Outro movimento, porém de alcance menor e menos “subversivo”, mas não menos potencialmente renovador, parece ter sido o da Ordem dos Templários, contemporâneo dos Cátaros, de início, apoiada pela própria Igreja de Roma.
 
Antes de nos voltarmos a estas duas, temos de precisar o que foi e como se fez o poderio da Igreja Romana na Europa.
 
A Ascensão da Igreja Católica Romana
 
O movimento cristão – de início, um movimento emergido no seio do judaísmo na palestina, e logo espalhado por outras regiões do Império, Ásia Menor e Norte da África – deitou raízes em vários quadrantes, de onde surgiram vários grupos com suas próprias tradições interpretativas da mensagem de Jesus. As comunidades da Ásia Menor, da Grécia, de Alexandria e de Roma formavam Igrejas independentes, ainda que mantivessem contato umas com as outras. Porém, devido à sua localização, a comunidade de Roma tinha um certo destaque, que seria ainda mais reforçado quando Constantino reconheceu e oficializou o Cristianismo, tendo em mente, entre outras, a utilizá-lo como cimento espiritual do Império. Logo após, porém, Constantino dividiu o Império em duas partes, a do Ocidente, com capital e Roma, e a do Oriente, em Constantinopla. A Igreja igualmente teria duas cabeças principais, uma em Roma, tendo por língua oficial o Latim, e outra em Constantinopla, tendo por língua oficial a mesma que já vinha sendo a língua geral desde o início do Império, o Grego (que também foi a língua em que foram escritos e traduzidos os primeiros livros cristãos). Roma teria o Bispo, chamado posteriormente de Papa, e Constantinopla, de Patriarca. O que, de início, começou como uma religião dos oprimidos do império, indo dos povos colonizados, passando pelos escravos e grande maioria de plebeus, constituía, apesar da perseguição oficial do Império, uma crescente comunidade no sentido lato do termo, um comunismo autêntico, gerado pela compreensão da dor mútua e da partilha de ideais de igualdade e fraternidade. Porém, os dominados passaram a ser muito mais numerosos que os dominantes e, com a entrada destes, por interesses políticos diante da transformação do Império, os dominadores acabaram tornando-se novamente preponderantes e passaram a exigir que o Cristianismo abrigasse práticas e detalhes dos antigos cultos pagãos. Daí os sacerdotes católicos com seus altares, missais, estolas, mitras, etc. O fator político-econômico passou a moldar o Cristianismo oficializado, tendo seus aspectos originais sido deturpados pela simbiose Cristianismo de Constantino/religião pagã.
 
Ao longo do século V, porém, a Igreja Romana viveu sérias ameaças à sua sobrevivência e, por volta de 490, a situação tornou-se desesperadoramente precária, isto porque, com a mudança da maior parte das pessoas para Constantinopla, a ex-grande cidade ficava à mercê das invasões bárbaras do norte da Europa. E a igreja de Roma estava ainda muito longe de ter a hegemonia do poder espiritual na cristandade dentro e fora do Império, processo inevitavelmente ligado à implosão ocidental deste – agravada pelo fato de Constantino haver transferido a corte de Roma para Constantinopla. Pouco antes da transferência, entre 384 e 399, com o apóio oficial, o bispo de Roma já era denominado papa, mas isto não significava muito, pois sua condição oficial, em termos de cristandade, era bem diferente do que passou a ser alguns séculos mais tarde quando passou a desempenhar o papel de líder e cabeça suprema do cristianismo ocidental – Os gregos e outras comunidades do leste europeu e da África e Ásia jamais aceitaram esta condição, no que resultou no cisma entre as Igrejas Católica Romana e Católica Ortodoxa no século XI. Na verdade, até o século V o papa era uma figura que representava apenas uma função centralizadora de interesses velados do colégio eclesiástico romano, que já possuía e investia pesado em uma supremacia teológico-política. Mas esta era apenas uma escola dentre muitas outras linhas do cristianismo, todas lutando por manterem-se vivas e adotarem livremente seus pontos de vista a respeito da mensagem do Cristo. A Igreja de Roma, sob pressão de Constantino, que a rigor, continuava sendo um crente dos cultos a Mitra e do Dol Invictus, cuja festa máxima era comemorada no solstício de inverno, no dia 25 de dezembro, lutava desesperadamente para sobressair-se dentre as demais, combatendo uma grande variedade de pontos-de-vista teológicos diferentes dos seus. A pesar de encravada no coração do Império, de início a Igreja de Roma não possuía moralmente maior autoridade que outras, como, por exemplo, a Igreja Grega ou a Igreja Celta. E sua autoridade não era maior que a de outras correntes cristãs ainda mais distantes, do leste e o oeste de Roma.
 
Se a Igreja de Roma quisesse sobreviver à derrocada do Império (na verdade, tendo uma tentativa de manter alguma coisa deste) que se esfacelava diante das invasões bárbaras e, ainda, criar uma hegemonia sobre todo o pensamento cristão, exercendo uma grande autoridade e poder, ela necessitaria do apóio de um reino forte e de uma poderosa figura secular que pudesse representá-la resgatando um pouco da mística do Império dos Césares, impondo grande reverência e respeito. Daí que, para que o mundo cristão evoluísse segundo a doutrina romana, a Igreja Católica deveria ser disseminada, implementada e imposta por meio da força secular – uma força suficientemente poderosa para enfrentar e finalmente extirpar o desafio das outras escolas cristãs.Por volta de 486, um rei bárbaro, o rei franco-merovíngeo Clóvis, tinha expandido extraordinariamente a extensão de seus domínios, anexando reinos e principados adjacentes e vencendo várias tribos rivais. Cidades importantes passaram a fazer parte de seu reino, como Troyes, e Amiens, nas regiões da Gália. Em pouco mais de 10 anos de conquistas, Clóvis era o chefe mais poderoso da Europa Ocidental. E foi em Clóvis que a Igreja Católica tinha achado um campeão para seus interesses. E foi através de Clóvis que a Igreja Católica finalmente iria conseguir estabelecer uma supremacia que não foi seriamente questionada – devido à “Santa” Inquisição – na Europa por mais de mil anos.
 
O pacto estabelecido entre Clóvis e a Igreja assegurou um triunfo político para ambas as partes. Ao primeiro assegurava legitimidade numa época em que os ideais cristãos suplantavam os pagãos, e à segunda era assegurada sua sobrevivência, consolidando-a como igual, em condições, à Igreja Ortodoxa Grega, de Constantinopla (muito influente por conta do Império Romano do Oriente, vivo e palpitante até o século XV). Isto faria a Igreja de Roma estabelecer-se como a suprema autoridade espiritual – com base na força militar do reino franco-merovíngeo – na Europa Ocidental.
 
A conversão e o batismo de Clóvis marcariam o nascimento de um novo Império Romano, pretensamente cristão, baseado na Igreja de Roma e administrado, ao nível secular, pelo reino franco e pela linhagem merovíngea – posteriormente traída e derrubada pela própria Igreja. Com poderosa eficiência, a fé católica foi imposta pela espada, e os traços das outras igrejas foram, a partir de então, afrontados pela força e irremediavelmente apagados (em parte) da história; com a sanção da Igreja, o reino franco expandiu-se para o leste, englobando a maior parte da França, Alemanha e outros países modernos.
 
Dois séculos mais tarde, a Igreja já era suficientemente poderosa para achar que a linhagem merovíngea de Clóvis começava a ser um empecilho. Dagobert II, descendente de Clóvis, foi um rei forte que conseguiu domar a anarquia que, antes dele, começava a dominar o reino franco, restabelecendo a ordem, e reconhecendo os interesses políticos e, portanto, cada vez mais menos espirituais da Igreja. Tanto assim que ele parece ter abortado deliberadamente as tentativas desta de se expandir ainda mais. E, em virtude de se ter casado com uma princesa visigoda (cujo povo, apesar de declarar fidelidade a Roma, tinham um imensa simpatia por idéias consideradas “heréticas”, ou seja, por interpretações da mensagem de Cristo não aceitas pela ortodoxia latina) havia adquirido um imenso território, onde hoje é o Languedoc, região Sul da atual França e base dos futuros Cátaros. Dagobert parece ter adquirido algumas das tendências arianas que questionavam a autoridade da Igreja. Com tudo isso, não é de se estranhar que ele tenha obtido inúmeros inimigos políticos, entre eles seu chanceler, Pepino, o Gordo, que, alinhando-se com outros inimigos e com a Igreja, planejaram o assassinato de Dagobert e o extermínio da linhagem merovíngea. Cabe salientar que, dois séculos após sua morte, Dagobert II foi canonizado, como uma forma de encobrir a traição visível da Igreja ao pacto que fizera com Clóvis.
 
Os Cátaros
 
Nas palavras da Igreja Romana, no século XII a região do Languedoc estava “infectada” pela heresia de um movimento considerado por ela como nocivo, chamado de catarismo pela Igreja de “a lepra louca do sul”(não suportava a Santa Madre Igreja qualquer concorrência ao seu domínio espiritual e político nem tolerava qualquer interpretação espiritual fora das instruções romanas). Embora fosse sabido por todos, em especial nas regiões adjacentes ao Langedoc, que os adeptos dessa heresia fossem essencialmente pacíficos e muito estimados pela população local, tendo muitos nobres entre eles. Tal movimente se constituía, para os doutores do Vaticano, uma grave ameaça à autoridade romana, a mais grave que Roma encontraria nos três séculos seguintes, até a chegada de Martinho Lutero. Por volta de 1200, a popularidade do movimento era tal que havia realmente a possibilidade real de que o catolicismo romano fosse substituído, como forma predominante de cristianismo, no Languedoc, pelo catarismo que estava se irradiando para outras partes da Europa.
 
E, 1165 a Igreja havia condenado formalmente o catarismo na cidade de Albi, no Languedoc. Daí por que os conhecemos também por albigenses. Muitas de nossas informações sobre eles provêm de fontes eclesiásticas católicas, e criar um quadro correto dos cátaros a partir destes documentos é como compreender a resistência estudantil brasileira, no tempo da Ditadura, a partir dos relatórios dos militares e do DOI-CODI, ou compreender a Resistência Francesa, na Segunda Guerra Mundial, a partir dos relatórios da Gestapo. Em geral, os cátaros acreditavam na doutrina da reencarnação e reconheciam Deus não como um princípio com traços antropomórficos puramente masculino, mas como tendo, igualmente, princípios femininos. Na verdade, Deus estava bem acima das limitações do entendimento humano (o que nos remete, em parte, à doutrina dos Druidas e Pitágoras e Platão). Tanto que os pregadores e professores das congregações cátaras, conhecidos como parfaits, eram de ambos os sexos. Sendo o ser humano criação e filiação da divindade, as polaridades masculinas e femininas não seriam antagônicas, mas complementares, e, portanto, igualmente importantes.
 
Seu principal texto teológico era o Evangelho de João e um outro texto (talvez o mesmo Evangelho de João) que eles chamava de o Evangelho do Amor. Ao mesmo tempo, rejeitavam veementemente a autoridade da Igreja Católica e negavam a validade das hierarquias clericais, ou de intercessores oficiais entre Deus e o homem. Diziam eles que não encontravam em parte alguma dos Evangelhos justificação para a estrutura eclesial romana. No centro desta oposição residia um principio extremamente importante: a fé só é real se vivida e sentida como uma experiência mística direta, sem passar por uma segunda mão. Além do mais, a única fé real era que produzisse obras, e os cátaros ficaram famosos e adquiriram imensa popularidade pela ação social que promoveram no Languedoc, dando tratamento gratuito de saúde e educação a todos, e sendo tolerantes com membros de outros credos, inclusive judeus, que viviam em paz na região. Em tal ênfase na experiência mística direta e aplicada em uma ética socialista vemos claramente a influência do neoplatonismo, em especial Plotino no pensamento captarão, mas talvez seja mais correto ainda dizer que aqui provavelmente a influência mais direta veio do Cristianismo puro. Hoje diríamos que os cátaros buscavam vivenciar uma experiência de comunhão com Deus, ou uma experiência de transcendência, num domínio Transpessoal, que, antes, chamávamos de místicas.
 
Esta experiência chamava-se gnosis, que em grego significa “conhecimento”, e era privilegiada sobre todas as outras formas de credos e dogmas pelos cátaros. A ênfase na experiência direta com o transcendente, o transpessoal, tornava supérfluos padres, bispos e quaisquer outras autoridades eclesiásticas.
 
Assim, a Igreja, sentindo-se realmente ameaçada, tomou a iniciativa de formar uma Cruzada (a primeira dentro da Europa e contra irmãos cristãos ocidentais, já que cristãos orientais foram trucidados, com as bênçãos de Roma, junto com árabes e judeus nas estúpidas Cruzadas clássicas à Terra Santa) com o fim de extirpar de vez com a “heresia” cátara: a Cruzada Albigense.
 
Em 1209, um exército de mais de 30 mil homens, desceu do norte da Europa em direção ao Languedoc, no sul da França, para executarem uma das maiores carnificinas da história humana. Na guerra que se seguiu, a população tomou a espada e defendeu com ênfase os cátaros contra o despotismo católico.
 
Diz-nos o professor Hermínio C. Miranda que:
 
“Na verdade, a calamidade que se abatera sobre a região atingia em cheio também os católicos (locais). E não apenas aqueles que davam certa cobertura aos ‘heréticos’ e os respeitavam e até tinham por eles claras simpatias. Em repetidas oportunidades, a população lutou (e morreu) unida, contra o inimigo comum – independentes de preferências religiosas. Aliás, como temos visto, o povo convivia muito bem com os cátaros, tinha entre eles amigos e parentes e deles recebia atenção, ensinamentos, assistência social, religiosa e tratamento de saúde, fossem ou não croyants” (MIRANDA, 2002, p 240).
 
Igualmente interessante é a observação do escritor H. G. Wells no volume II de História da Civilização, à página 380:
 
“E é assim que vemos o espetáculo de Inocência III a pregar uma cruzada contra esses desafortunados sectários e a permitir o alistamento de todos os desclassificados, vagabundos e desordeiros da época, na obra de levar o fogo e a espada, a violência e o rapto e todos os ultrajes concebíveis aos mais pacíficos súditos do rei da França. As descrições das crueldades e abominações dessa cruzada são de leitura bem mais terrível do que qualquer narração dos martírios dos cristãos pelos pagãos e possuem, além disso, o acrescido horror que lhes vem de as sabermos indiscutivelmente verdadeiras”.
 
A região do Languedoc, porém, era independente da França, tendo mais ligações com a Espanha. A cruzada, anexando toda a região à França, além das barbaridades cruéis contra pessoas de bem, revoltou ao extremo toda a população local, incluindo os católicos, que lutaram ao lado e a favor dos cátaros. Assim, quando finalmente o temido e odiado líder militar da cruzada, Simon de Montfort, foi finalmente abatido (conta-se, quando uma pedra de catapulta lançada por uma guarnição feminina da resistência lhe esmagou a cabeça), toda a cidade de Tolosa (atual Toulouse) explodiu de alegria. Uma canção popular da época, em língua Occitana, ou “Oc”, muito parecida com o português – daí Languedoc, ou língua de oc – assim comemorava:
 
Montfort
Es mort
Es mort
Es mort!
Viva Tolosa
Ciotat Gloriosa
Et Poderosa!
Tornan lo paratge et l’onor!
Monfort
Es mort!
Es mort!
Es mort!
 
Todo o território da região ao redor de Toulouse e Carcassonne foi pilhado e as cidades e vilarejos arrasados sem dó nem piedade. Fogueiras imensas eram acessas e nelas, homens, mulheres e jovens eram assados em uma selvageria e sede de morte sem igual. Em algumas cidades, mais de 400 pessoas morreram desta forma “cristã” em uma única noite. Esta febre fanática constituía o fervor cruzado, pois foi prometido pelo Papa que todos os que participassem da “Santa Cruzada” por 40 dias e demonstrassem eficácia contra a heresia teriam não só seus pecados perdoados, como ainda obteriam benefícios materiais legítimos pelo saque. Só na cidade de Beziers, por exemplo, 15 mil homens mulheres e crianças foram exterminados, muitos até mesmo dentro de igrejas. Quando um oficial perguntou a um representante espiritual do papa Inocêncio III, o cínico Arnaud Amaury, arcebispo de Narbonne, como ele iria reconhecer um herege dos crentes verdadeiros, a resposta foi: “Mate-os todos. Deus reconhecerá os seus”. Este ainda escreveu orgulhoso a Inocêncio III que “nem idade, nem sexo, nem posição foram poupados”…. Depois os hereges maléficos eram os cátaros….
 
Ainda assim, os inocentes cátaros e todos os que conviviam na região sofreram abusos indescritíveis. Mesmo assim, “como nos primeiros tempos do cristianismo, os cátaros continuavam a pregar suas idéias pelos campos, nos bosques, em esconderijos e em casas de um ou outro mais corajoso simpatizante e até nas cavernas, numa trágica simetria com as catacumbas frequentadas pelos cristãos primitivos. Não se entregavam, não renegavam suas idéias, nem mesmo quando se lhes oferecia a escolha final entre a vida e a fogueira, ou seja, entre a fé e a morte. A opção de todos – com ínfimas exceções, uma unanimidade – era pelo sacrifício supremo, sem um gemido, temor ou angústia” (MIRANDA, 2002, p. 252).
 
A guerra cruel durou cerca de quarenta anos. Quando terminou, toda a Europa caiu numa espécie de modorra e barbárie, e a Igreja se impôs, pelo espetáculo desumano que cometera, como a única legítima representante de Deus, exercendo poder até mesmo em assuntos civis e de estado, e para que se evitasse um ressurgimento da novas ameaças ao domínio da Igreja, foi criado uma das mais cruéis, vergonhosas e desumanas instituições da História: a “Santa” Inquisição, de triste memória, e que deu nomes de porte de um Torquemada. Oficialmente extinta, a Inquisição, porém, continua com outro nome: Congregação para a Defesa da Fé, tendo feito, no século XX, novas vítimas, entre elas Pierre Teilhard de Chardin e, mais recentemente, Leonardo Boff. O seu atual mentor se consolida na figura do Cardeal Joseph Ratzinger. Ainda não queimando mais corpos, ainda pode queimar obras e proibir idéias nas universidades católicas e nas editoras mantidas pela Igreja, usando ainda veículos impressos e outras mídias para anematizar que pensar diferente…
 
Tendo sedimentado seu total controle na Europa ocidental, a Igreja dominante constituía-se em uma instituição poderosa econômica, política e militarmente. Equiparava-se a um gigantesco feudo, e sua organização impunha uma violenta censura e controle espiritual e intelectual (ou crer ou morrer), submissão total 0à autoridade eclesiástica, etc. Em brutal e explícita oposição ao socialismo humanista dos primeiros cristãos, a Igreja de Roma punha-se com toda a violência que dispunha contra todos os que questionassem a legitimidade cristã de tais atitudes.
 
Um dos movimentos que mais tinha certas ligações com os cátaros era a Ordem dos Templários, criado na Terra Santa, e que representavam uma associação militar cristã, oficialmente protetora das peregrinações religiosas e responsável pela guarda e câmbio de bens, mas igualmente aberta ao estudo e discussão de assuntos místicos. Mas este é uma outra história, e aconselho o leitor a ler mais sobre ambas as ordens.
 
 
Bibliografia:
 
 
Michael Baignet, Richard Leigh e Henry Lincoln, cujo livro O Santo Graal e a Linhagem Sagrada, Editora Nova Fronteira, 1997, serviu de inspiração e motivação para esta página
Hermínio C. Miranda, em seu excelente livro “Os Cátaros e a Heresia Católica” faz um fabuloso e cativante resumo de quase tudo o que já foi escrito sobre o catarismo. Editora Lachâtre, 2002.
Graham Simmas, Marylin Hopkins e Tim Wallace-Murphy retomam a temática de O Santo Graal e a Linhagem Sagrada em seu excelente livro “Rex Deus”, aprofundando as motivações políticas da Igreja na perseguição aos cátaros e aos templários.

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