segunda-feira, 10 de julho de 2017


Encadeamento Lógico dos Graus do Rito Escocês Antigo e Aceito

Charles Evaldo Boller

 

Sinopse: Considerações e significado da aparente desordenação dos graus do Rito Escocês Antigo e Aceito.

 

Ao fazer resumo dos graus filosóficos do Rito Escocês Antigo e Aceito buscou-se por um encadeamento lógico entre eles; um ou outro formam certa ligação, mas a conclusão até o momento é: não existe interconexão; os diversos graus não mantêm vínculo entre si; o amor é elo da maioria, mas existem graus que dele nem passam perto; é como se os temas dos graus fossem jogados ao léu, em desordem, logicamente desconexos, aleatórios em suas propostas, mas magníficos e esclarecedores em seus objetivos.

 

Esta inexistência de conexão lógica entre os graus é busca constante de mentes com formação cartesiana. Teria a Cabala respostas? O misticismo? O esoterismo? A lógica humana continua exuberante dentro da filosofia maçônica, seja ela mecanicista ou mística, mas em todos predomina cegueira, não se entende a possibilidade de existir ordem na desordem. O maçom busca a perfeição. Seu objetivo é a religação com a divindade. Estará ele munido de capacidade intelectual suficiente para ver beleza e ordem onde sua capacidade de pensar ainda não alcança e apenas vê desordem? Infelizmente é na busca desta condição de perfeição condicionada ao grau de evolução humana que se obscurece a razão para ver ordem na aparente desordem.

 

Kepler é bom exemplo quando forçou beleza e simetria em seus modelos, quando embutiu as órbitas planetárias do sistema solar em cubos e esferas; sabe-se hoje que as órbitas dos planetas que circundam o Sol são elípticas irregulares; ele não admitia que o Grande Arquiteto do Universo pudesse usar de figuras irregulares na construção do Universo. Esteve privado de visão devido à limitação da ciência e de seus referenciais transcendentais - em sua concepção, um Deus geômetra respeitaria proporções e figuras perfeitas na construção do Universo; aquilo que a mente de Kepler definia como perfeito e belo e não a realidade criada por Deus. Foi um erro de interpretação que trouxe luz para a ciência e assim ainda o é com respeito a muitas verdades a serem desveladas.

 

O sistema da ordem maçônica trata a mente de homens que pensam com lógica, mística e matemática em presença da desordem. Modifica o pensamento do místico e do sensitivo na presença da desordem e intui a presença de ordem. Leva o buscador cientista a encontrar nos mecanismos da Natureza a inspiração de espiritualidade que o religam ao Grande Arquiteto do Universo, mesmo na presença da aparente desordem. Existe evidência para especular e forte razão para inferir que a falta de ligação lógica entre os diversos graus do Rito Escocês Antigo e Aceito pretende demonstrar, provocar, que é na confusão que está assentada a ordem das coisas; que Deus escreve em "linhas tortas", em linguagem ainda incompreensível, indecifrável ao homem, todo o projeto do Universo. E que esta linguagem, em virtude da visão limitada do homem, mantém aparência de desordem quando em verdade manifesta perfeição num nível superior á compreensão da criatura.

 

A psique humana insiste em buscar ordem, perfeição e disciplina na Natureza porque não aceita que vai morrer, decompor-se em seus elementos químicos elementares, voltar para o lugar de onde foi tomado. Se o homem abandonar a ideia de buscar perfeição naquilo que ele define como perfeito, lógico e belo, encontrará na imperfeição, na aparente desorganização, razões onde tudo é gerado de forma perfeita e bela. Verá ordem no que aparenta desordem, haja vista o homem ser limitado pelos seus sensores e ainda é incapaz de entender a lógica do Criador. O indício transmitido da desarrumação dos graus acena que é da mistura de ideias e sentimentos, emanada da filosofia dos graus que ocorre ligação mais forte com a Natureza no bailado que celebra a vida.

 

Platão afirmava que o único círculo perfeito é a ideia de círculo que existe na imaginação. É comum encontrar o que insiste na formação de ligação matemática e perfeita entre o Grande Arquiteto do Universo e sua criatura, o homem. Ao olhar-se para a Natureza revela-se exatamente o contrário, que a ordem reside na confusão, da diversidade. Pretendem alguns que a experiência mística da existência da divindade de alguma forma esteja ligada ao homem por equações matemáticas, pela lógica ou consciência transcendente ao mundo físico. Sábios tentam estabelecer pontes entre a razão humana e a inteligência divina. O encadeamento ilógico dos graus do Rito Escocês Antigo e Aceito levanta a possibilidade de se observar a origem da Natureza no caos.

 

Ao se especular a história do Cosmos, desde o início da grande expansão até a formação da célula, o caos é uma boa e razoável - não única - explicação para a existência da vida. Quando o homem olha a si mesmo: primeiro - como matéria feita com quase nada de massa; se considerar o átomo composto essencialmente de espaço vazio, possuidor de diminutas partículas; que todas juntas possuem massa insignificante, mas tremenda energia; isto pode até justificar a volta ao pó. Segundo - como matéria totalmente destituída de massa, absolutamente nada em termos físicos; se o átomo for considerado resultado de fenômenos eletromagnéticos; o átomo ser o resultado da interação de campos magnéticos, dipolos; apenas energia; nada de matéria; apenas o vazio, o nada; isto pode até justificar a volta para a luz. Somos pó? Somos luz? Ainda não sabemos ao certo. Experiências de laboratório demonstram que a superfície da pele humana emite brilho, luz, fótons, que pode ser a manifestação do corpo físico do homem possuir nada em termos materiais, montado a partir da mais pura energia. A partir destas meditações pode-se especular que neste nível de observação da Natureza abala-se qualquer convicção de ordem e perfeição; ressalta-se desta observação que a vida é resultado de imperfeições, acidentes e assimetrias que ocorreram na linha de tempo construída pela história do Cosmos. A existência da vida ainda é um acontecimento fora das leis naturais inferidas pela concepção tecnológica e mística humana.

 

O que é inexplicável à compreensão humana ou é denominado milagre ou se constrói ao seu redor uma interpretação mística que usa da perfeição interpretada pelo homem e, a semelhança de Kepler, encaixa-se tudo o que não se consegue explicar dentro de padrões que são familiares aos sensores materiais. Na concepção do homem material, em sua concepção antropomórfica, o Grande Arquiteto do Universo usaria apenas aquilo que a mente humana já concebeu em termos de perfeição e beleza. É o homem quem encaixa o que não entende em padrões simbólicos ao seu alcance e é por isso que não aceita o padrão definido pelo Grande Arquiteto do Universo na construção do Universo. É a razão do maçom não discutir a constituição e aparência do Grande Arquiteto do Universo, um ser desta magnitude está fora de sua capacidade sensorial; cada homem cria um Deus de acordo com sua própria experiência sensorial. O conceito maçônico de Grande Arquiteto do Universo é o mais inteligente dos estratagemas para obter liberdade de dogmas e falácias resultantes da interpretação humana do Universo e da vida.

 

O homem que se conscientiza como resultado perfeito de fenômenos aleatórios e imperfeitos, percebe, justifica e testifica a existência de uma mente orientadora e criadora à qual o maçom materializa pelo conceito de Grande Arquiteto do Universo. Sem uma mente por detrás do caos a concepção de vida é impossível. Caos transmite para a lógica humana a ideia de destruição, imperfeição e apenas uma força ou mente orientadora poderia, na concepção humana de perfeição, colocar ordem no caos. O homem apenas não domina ainda a capacidade de entender como o Arquiteto dos Mundos desenha a matéria animada e inanimada; principalmente de onde resulta a vida, o que certamente afastaria o medo da morte, do nada, do esquecimento.

 

O homem considera-se muito importante, é a criatura eleita, o centro do Universo. Falta-lhe humildade para reconhecer que o código, a lógica divina está escrita em símbolos que ainda não formam sentido nem para a mente de formação mecanicista nem para a de formação mística. Todas as criaturas vivas da biosfera da Terra são parte de uma única criatura viva e interdependente, onde o homem é apenas mais uma criatura deste imenso caldeirão de massa viva. Sua percepção ainda não está capacitada para entender o alfabeto e a lógica do Grande Arquiteto do Universo. E como tenta construir a lógica divina enclausurada em sua própria experiência, condicionada a ilusão percebida pelos seus próprios sentidos, as tentativas de esclarecimento conduzem a respostas falaciosas, inverdades. Daí uma minoria tentar impor suas verdades aos demais pela força, resultando em prepotência e obscurantismo, empecilho na busca de aperfeiçoamento da simbologia da criação. O homem iludido pela sua percepção do Universo há que aperfeiçoar seus sensores ou utilizar-se de instrumentos que permitam ver muito além de sua restrita realidade, até o momento em que consiga ver ordem no caos.

 

A filosofia é um instrumento que permite ver aonde não existe luz, onde os sensores materiais e místicos nada percebem. A luz provém do caos. A ordem é inanimada, não se modifica, é sinônimo de morte. O caos é movimento, é energia, é manifestação de vida. Da divisa dos graus filosóficos do Rito Escocês Antigo e Aceito verte "ordo ab chao", "ordem no caos"; ou seria, "a ordem está no caos"?

 

Bibliografia:

 

1. ABBAGNANO, Nicola, Dicionário de Filosofia, Dizionario di Filosofia, tradução: Alfredo Bosi, Ivone Castilho Benedetti, ISBN 978-85-336-2356-9, quinta edição, Livraria Martins Fontes Editora Ltda., 1210 páginas, São Paulo, 2007;

 

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4. ADOUM, Jorge, Secretário Íntimo, Preboste e Juíz e Intendente dos Edifícios, Esta é a Maçonaria, 14ª edição, Editora Pensamento Cultrix Ltda., 149 páginas, São Paulo, 2004;

 

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6. ALENCAR, Renato de, Enciclopédia Histórica do Mundo Maçônico, Volume II, primeira edição, Maçônica, 445 páginas, Rio de Janeiro, 1980;

 

7. ANATALINO, João, Conhecendo a Arte Real, A Maçonaria e Suas Influências Históricas e Filosóficas, ISBN 978-85-370-0158-5, primeira edição, Madras Editora Ltda., 320 páginas, São Paulo, 2007;

 

8. ASLAN, Nicola, Grande Dicionário Enciclopédico de Maçonaria e Simbologia, Volume I, ISBN 85-7252-158-5, segunda edição, Editora Maçônica a Trolha Ltda., 1270 páginas, Londrina, 2003;

 

9. ASLAN, Nicola, Instruções para Capítulos, para o 15º ao 18, ISBN 85-7252-218-2, quarta edição, Editora Maçônica a Trolha Ltda., 114 páginas, Londrina, 2006;

 

10. ASLAN, Nicola, Instruções para Conselhos Kadosch, para o 19º ao 30, ISBN 85-7252-175-5, terceira edição, Editora Maçônica a Trolha Ltda., 100 páginas, Londrina, 2003;

 

11. ASLAN, Nicola, Instruções para lojas de Perfeição, Do Quinto ao 14º Graus do Ritual Escocês Antigo e Aceito, ISBN 85-7252-174-7, quarta edição, Editora Maçônica a Trolha Ltda., 102 páginas, Londrina, 2003;

 

12. ASLAN, Nicola, Instruções para lojas de Perfeição, para o Quarto Grau, ISBN 85-7252-188-7, terceira edição, Editora Maçônica a Trolha Ltda., 116 páginas, Londrina, 2004;

 

13. BRASIL, Supremo Conselho do Grau 33 do Rito Escocês Antigo e Aceito para a República Federativa do, Ritual do Grau 14 e Graus Inefáveis Intermediários 10, 11, 12 e 13 do Rito Escocês Antigo e Aceito, segunda edição, Supremo Conselho do Grau 33 do Rito Escocês Antigo e Aceito para a República Federativa do Brasil, 174 páginas, Rio de Janeiro, 1925;

 

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15. CAMINO, Rizzardo da, Os Grau Inefáveis, loja de Perfeição, Volume 1, Do Quarto ao Décimo Grau, primeira edição, Editora Maçônica a Trolha Ltda., 178 páginas, Londrina, 1995;

 

16. CAMINO, Rizzardo da, Os Graus Inefáveis, loja de Perfeição, Volume II, primeira edição, Editora Maçônica a Trolha Ltda., 306 páginas, Londrina, 1966;

 

17. CASTELLANI, José, Dicionário Etimológico Maçônico, A-B-C, Coleção Biblioteca do Maçom, ISBN 85-7252-169-0, segunda edição, Editora Maçônica a Trolha Ltda., 143 páginas, Londrina, 2003;

 

18. CLAUSEN, Henry C., Comentários Sobre Moral e Dogma, primeira edição, 248 páginas, Estados Unidos da América, 1974;

 

19. DURÃO, João Ferreira, Ordenanças Graus Inefáveis: Cobridor, Rito Escocês Antigo e Aceito, ISBN 85-7374-700-5, primeira edição, Madras Editora Ltda., 160 páginas, São Paulo, 2005;

 

20. FAGUNDES, Morivalde Calvet, Uma Visão Dialética da Maçonaria Brasileira, Coleção Pensamento Maçônico Contemporâneo, primeira edição, Editora Aurora Ltda., 64 páginas, Rio de Janeiro;

 

21. FIGUEIREDO, Joaquim Gervásio de, Dicionário de Maçonaria, Seus Mistérios, seus Ritos, sua Filosofia, sua História, quarta edição, Editora Pensamento Cultrix Ltda., 550 páginas, São Paulo, 1989;

 

22. GUIMARÃES, João Francisco, Maçonaria, A Filosofia do Conhecimento, ISBN 85-7374-565-7, primeira edição, Madras Editora Ltda., 308 páginas, São Paulo, 2003;

 

23. OLIVEIRA FILHO, Denizart Silveira de, Comentários Aos Graus Inefáveis do Ritual Escocês Antigo e Aceito, Coleção Biblioteca do Maçom, ISBN 85-7252-035-X, primeira edição, Editora Maçônica a Trolha Ltda., 192 páginas, Londrina, 1997;

 

24. PETERS, Ambrósio, Maçonaria, Verdades e Fantasias, primeira edição, 252 páginas, Curitiba, 1927;

 

25. SOBRINHO, Octacílio Schüler, Maçonaria, Introdução Aos Fundamentos Filosóficos, ISBN 85-85775-54-8, primeira edição, Obra Juridica, 158 páginas, Florianópolis, 2000.

 

Biografia:

 

1. Johannes Kepler, astrônomo de nacionalidade alemã. Nasceu em Weil der Stadt em 27 de dezembro de 1571. Faleceu em Regensburg em 15 de novembro de 1630 com 58 anos de idade. Conhecido pela elaboração dos três princípios que regem os movimentos dos planetas em torno do Sol.

 

Data do texto: 31/08/2010

 

Sinopse do autor: Charles Evaldo Boller, engenheiro eletricista e maçom de nacionalidade brasileira. Nasceu em 4 de dezembro de 1949 em Corupá, Santa Catarina. Com 61 anos de idade.

 

Loja Apóstolo da Caridade 21 Grande loja do Paraná

 

Local: Curitiba

 

Grau do Texto: Aprendiz Maçom

 

Área de Estudo: Filosofia, Maçonaria, Ritualística

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