Veneráveis e Veneralatos
Tal como o Rui Bandeira sabiamente explanou nos
seus últimos dois textos e que se reportavam à vida interna das Lojas maçônicas,
também é de fulcral relevância salientar o contributo que os Veneráveis Mestres
(VM) (“presidentes da Loja”) têm em relação à vida interna destas Lojas.
A própria
dinâmica da Loja depende grande parte da dinâmica imprimida pelo seu Venerável
Mestre bem como pela sua forma de gerir os “destinos” da Loja.
Uma larga
maioria não consegue separar – e isto não é crítica sequer – o mundo
profano do mundo iniciático, ou seja, por defeito profissional, muitos
nas suas vidas laborais gerem e dirigem pessoas, logo tenderão a agir na
Maçonaria da mesma forma que o fazem no mundo profano. Sendo também, por isso
mesmo, mais fácil para estes tomar a seu cargo os destinos de uma Loja e a
gerir o que lá se passa no seu interior. Mas não releguemos também que a
sua forma de agir e estar perante a Sociedade, a sua Educação e Formação Acadêmica
também auxiliam e muito o seu (bom!) desempenho, nomeadamente na forma de lidar
com a Loja e os seus membros.
Não existem
manuais de sobrevivência para um “VM”, existirão sim pequenos guias ou
opúsculos que algumas Lojas ou Obediências tenham escrito para facilitarem um
pouco a vida de quem durante um ano (em média) terá a responsabilidade de gerir
a Loja, mas o essencial para a gestão da Loja será a sua vivência e praxis
maçônica. Sendo que uns serão mais “ritualistas” e outros mais
“administrativos” no cumprimento das suas funções.
– Cada um
como cada qual… –
Mas não
obstante, esta diferenciação da forma de gerir e de estar, pois a cada
identidade corresponderá uma forma de gerir, permite a vantagem mesmo que uma
Loja tenha uma prática de trabalho homogênea, esta será sempre um pouco
diferente de ano para ano, possibilitando aos seus membros não ficarem reféns
de um certo marasmo que não lhes possibilite evoluir, seja maçônicamente quer
pessoalmente.
Outra das
vantagens que diferentes abordagens ou estilos de gestão permite, é que pelo
facto de a presidência da Loja ser quase sempre anual e dependente de sufrágio
pelos Mestres que compõem a assembleia da Loja, impedirá, por certo(!),
determinadas formas gestionais de cariz ditatorial prolongadas no tempo;
resultando que se um dado “VM” desempenhar mal ou de forma nefasta o seu cargo,
a Loja somente terá de o “aturar” um ano – ou menos ! -, mas
possibilitando a alguém que desempenhou um bom ofício, que soube conviver
bem com as responsabilidades que lhe estavam inerentes, e que num bom
português eu possa dizer que tenha levado a Loja a “bom porto”,
deixando saudades e inclusive “fazendo escola”, criando assim alguns seguidores
que queiram prosseguir nessa forma de (bem) gerir.
– E cada
Loja é uma Loja, tal como cada maçom é diferente do seu semelhante -.
Cada Loja
tem a sua identidade própria, podendo ser parecida ou não com as outras de uma
mesma Obediência, até porque cada Loja é formada por gente que também pode ser
diferente entre si. A heterogenia dos seus membros é uma das grandes
qualidades que a Ordem Maçônica se pode orgulhar e enaltecer.
Mas por
outro lado, e porque nem tudo “são rosas…”, nem sempre corre tudo bem ou como
deveria ocorrer, dado existirem, por vezes, Lojas que não deveriam estar sequer
em funcionamento dado que o que se passa no seu seio ser tudo menos maçônico, e
quase sempre com a conivência do seu “VM”. – mesmo que ele não seja o
responsável por tais atos, a Loja depende dele e ele será sempre a pessoa que
dará a cara pela Loja! – E por causa disto é que um “VM” tem de ter características
naturais de um Homem bom, Livre e com bons costumes, – soa a “beato” mas
é assim que tem de ser – para que tais situações menos nobres não ofusquem a
Luz que deve resultar da Maçonaria e emanar na sociedade à sua volta.
Ser “VM” não
é tarefa fácil, não é “bater malhete” como se queira… Existem determinadas
regras a cumprir e a fazer por cumprir!
Logo, ser
investido nas funções de Venerável Mestre não poder ser encarado de forma
singela, mas antes como uma demanda tanto pessoal como coletiva. Pessoal porque
tal é desempenhado através de um labor próprio e que depende intrinsecamente de
si mesmo, e coletivo porque é feito a bem da Loja e da Obediência em geral.
Não é fácil
esta tarefa, tal como salientei. E uma parte importante deste trabalho também e
que não pode ser esquecida é o apoio que os obreiros da Loja dão ao seu “VM”,
auxiliando-o na condução dos “trabalhos”, promovendo iniciativas em prol da
Loja, produzindo Trabalhos/Pranchas e debatendo respeitosamente a
vida interna da Loja.
Apenas uma
Loja com obreiros ativos e cujo “VM” seja alguém que possibilite a troca de
ideias efetivas, terá um bom prenúncio na sua existência, pois as boas decisões
nunca estão sozinhas e muitas das vezes para serem corretamente aplicadas
dependerão daqueles que, por sinal, as terão de cumprir…
E por isto que anteriormente afirmei é que considero que uma Loja não é
do seu Venerável Mestre, mas sim, que o Venerável Mestre é que é da Loja!
E quem não
interiorizar isto, ou não sabe ao que se propõe ou não estará bem na Maçonaria…
Mas nem
sempre quem já foi “VM” quis despir o seu cargo, isto é, são mestres que embora
já não detenham essas funções, mas que mesmo assim desejam e insistem em o a
continuar a o ser… Obstaculizando de forma premente o trabalho que o “VM” em
exercício possa fazer. Condicionando este com atitudes ou ideias suas e
acicatando os demais obreiros contra o desempenho do seu “VM”; considerando eu
isto como uma forma de rebelião que não deveria ter lugar num espaço onde a
fraternidade deveria ser um dos seus pilares fundamentais.
Mas pior que
isto, serão aqueles que nunca cumpriram tal ofício mas que acham que o
desempenharam ou que detêm o direito de o vir a ocupar de forma unilateral,
condicionando ativamente o desempenho que o “VM” deverá levar a seu cargo…
Enfim, há de
tudo um pouco…infelizmente!
Até existem
aqueles, sendo mestres ou não, que se acham a “voz da razão” e assim se acharem
os “donos da Loja”, bloqueando tudo (ou quase…) aquilo a que se propusera a
fazer o seu “VM”. E esta forma de inquinar uma Loja não deveria ser aceite
pelos seus membros e muito menos ser feita com a complacência de um “VM”, pois
foi ele o eleito para a direção da Loja e mais ninguém.
Uma coisa é
um “VM” aconselhar-se, outra diferente, é deixar outros executarem o
seu trabalho.
E é por isto
que amíude existem cisões e/ou “abatimentos de colunas” de Lojas com
“adormecimentos” ou transferências de membros para outras Lojas, porque já não
é possível a convivência entre si. Deixando eu à reflexão para os demais esta
situação que é deveras importante para a sobrevivência de uma Loja.
Um “VM” que
saiba desempenhar bem o seu cargo nunca permitirá que aconteça o que eu referi
e saberá, ou pelo menos tentará, gerir os egos e diferenças de opinião que
existem no seio da sua Loja. Essa sim, será talvez a maior dificuldade que
poderá encontrar durante o seu veneralato, pois as questões rituais ou
administrativas, quando não são graves, são facilmente tratadas ou
ultrapassadas. E regra geral são as Admissões de profanos com as suas
Iniciações, os “aumentos de salários/graus“, gestão corrente da
tesouraria da Loja e pouco mais. Aqui sim, um “VM” pode pelas suas qualidades
pessoais fazer diferente dos restantes que passam por essa função; a tal
“dinâmica” que abordei.
Felizmente
que a Respeitável Loja a que pertencem os Mestres “escritores” neste blogue
conta nas suas colunas com gente com conhecimentos suficientes para fazer
prosperar a Loja.
Apoiando-se
nos seus membros mais antigos que com a sua experiência e sabedoria corrigem
qualquer “desvio administrativo” ou erro ritual que possa surgir, bem como nos
seus membros mais recentes, gente pronta a “arregaçar as mangas” e por-se
a trabalhar, assim os deixem.
É somente devido a esta conflexão de “ideias e vontades”, convergindo numa ação perseverante e regular, é que uma Loja tem um bom futuro assegurado.
Não basta
viver à sombra de feitos do passado, e esta Loja os tem feito; há que criar
sempre novas dinâmicas e formas de gerir e a Respeitável Loja Mestre Affonso
Domingues nº5 conta já no seu historial de mais de 25 anos de trabalho
ininterrupto com gente capaz de o fazer por mais 25 anos e até mais… E gente
que pela sua forma de estar, pela sua sensibilidade pessoal e
apoiada nos vastos conhecimentos de alguns dos seus Irmãos, podem ser
“herdeiros naturais” da linha de sucessão criada à vários anos na Loja e
que ainda hoje em dia se utilliza.
E concluindo
um texto que já vai longo, um Venerável Mestre como sendo alguém com a
responsabilidade da gestão anual da Loja, nunca poderá pensar a curto prazo,
apenas na gestão corrente, mas sempre com um pensamento a médio/longo prazo,
para que a Loja não divirja nos seus destinos, não se preocupando em deixar um
“legado pessoal” mas sim, algo sustentado pelo tempo. E por isso mesmo, deve
ser alguém com vontade de trabalhar e com “espírito diligente” e
rigoroso, sendo meticuloso e disciplinado no que faz,
devendo ser o melhor “relações públicas” da sua Loja, pois ele é que
dará a cara por ela; não devendo ter um perfil autocrático, mas
antes um elevado sentido fraterno.
Em suma, ser
alguém que goste de trabalhar e que o faça pelos outros, não esperando qualquer
tipo de encómios à sua pessoa.
–
Somente tendo uma postura humilde perante os seus pares, pode um
“VM” ser exaltado pelos demais, e isto se assim o tiver de ser… –
Para além
disso, terá de ser alguém capaz de estabelecer pontes entre os Irmãos que
tenham divergências ou contendas entre si, sendo um bom ouvinte e confidente,
para além de ter a capacidade em aconselhar os obreiros naquilo que necessitem
do seu “VM”, e que saiba agir com a “parcimônia” necessária ao seu cargo, sem
impulsos ou afins… pois terá de ter a ponderação necessária a cada decisão
que tenha de tomar ou que venha a ter de aplicar em relação às funções a
si designadas como representante da Loja na Obediência onde esta se encontra
filiada. E chegando ao final do seu veneralato, ter a capacidade de fazer
um auto exame de consciência e refletir no que se propôs a fazer, no que fez e
no que poderia ter feito e extrair de aí as suas próprias conclusões, por forma
a que quando se sentar no Oriente ao lado do próximo “VM”, poder ser ele,
também, uma “voz” de e em auxilio a este, porque a função de Past-Venerável ou
Mestre Instalado não é mais que isso, uma voz em auxilio do novo Venerável
Mestre.
E como “VM”
reconhecer que recebeu a Loja com um determinado funcionamento, em determinado
momento, e que entregou ao seu substituto na “cadeira de Salomão” uma Loja que
deverá ser mais coesa e mais forte do que aquela que terá recebido do seu
antecessor, – esta é a sua obrigação! – o que nem sempre é simples de ser
feito.
Não deixando
nunca de ter sempre presente a noção de que por qual forma
pretenderá ser (re)conhecido no final do seu ano de trabalho, se por
ter sido “Venerável” ou pelo seu “Veneralato”…
Fonte: http://a-partir-pedra.blogspot.com.br/
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