Um
aspeto que é importante na vivência maçónica é a visitação, isto é, a
comparência, assistência e, se o desejar, intervenção de um maçom de uma Loja
em sessão de outra Loja. Ao visitar outra Loja, ainda que da mesma Obediência e
cidade, embora ambas trabalhando no mesmo rito e utilizando precisamente o
mesmo ritual, o maçom apercebe-se de discretas diferenças entre o que a Loja
visitada faz e o que a Loja que integra pratica. Se esse maçom continuar a
visitar a mesma Loja em várias sessões, aperceber-se-á inevitavelmente que
existem diferenças de cultura entre ambas as Lojas, a visitada e a sua.
Diferenças porventura ao nível da forma de debater as questões, ou da tomada de
decisões, ou ao nível da instrução dos Aprendizes e Companheiros, ou da
autonomia dos Oficiais do Quadro, ou ao nível de um sem-fim de aspetos.
Reconhece a Loja que visita como uma Loja maçónica similar à sua. Verifica que,
na essência, são da mesma natureza e prosseguem a mesma finalidade. Mas a forma
como o fazem, como traçam e seguem os respetivos caminhos, são diferentes. Em
suma, facilmente verifica em cada uma é diferente em relação à outra naquilo
que comummente os maçons designam como o projeto da Loja.
Fazer
essa verificação, adquirir essa noção, é intrinsecamente bom para o maçom.
Verifica assim diretamente que não há uma única maneira de fazer as coisas, que
se pode agir corretamente de variadas formas, aprende que a sua Loja, por ser a
sua, não é a detentora do segredo da perfeição na atuação maçónica.
Mas
afinal como se processa o mecanismo que faz com que grupos de pessoas
partilhando os mesmos objetivos, prosseguindo os mesmos propósitos, utilizando
o mesmo método, acabem por acumular diferenças, umas mais subtis, outras mais
evidentes, ao ponto de ser possível detetar verdadeiras diferenças na cultura
de cada Loja?
A
resposta é simples: a causa está em nós, em cada um de nós e em todos os
integrantes de cada Loja. Cada um de nós é diferente, dentro da nossa essencial
igualdade. O conjunto de maçons de cada Loja necessariamente que é diferente do
de outra Loja. Essas diferenças vão-se traduzir em posturas, escolhas, hábitos,
relações com leves ou mais acentuadas diferenças. O conjunto de caraterísticas
dos elementos de uma Loja, das respetivas interações, práticas e hábitos
individuais e coletivos, formas de trabalhar, de preparar, de organizar, de
executar, vai estabelecer o quadro de cultura de cada Loja.
Um
hipotético exemplo: duas Lojas, da mesma Obediência, trabalhando o mesmo rito,
reunindo na mesma cidade, estabeleceram duas práticas diferentes em relação a
um aspeto rotineiro da Loja. Uma apenas admite a inquéritos para Iniciação e,
se aprovados, a provas de Iniciação, elementos que sejam conhecidos e das
relações dos obreiros da Loja; a outra admite iniciar candidatos que tenham
manifestado o propósito de serem iniciados maçons em contacto com a Loja, ainda
que não sendo pessoas das relações de nenhum dos obreiros dela, embota tenha
estabelecido um mais completo e cauteloso processo de análise, de forma a proteger-se
de mal-intencionados, arrivistas e oportunistas.
A
primeira Loja ganhará em coesão o que perde em diversidade. Tendencialmente,
cresce e evolui em segurança, sem grandes surpresas nem clamorosos erros de casting,
mantendo um conjunto de obreiros com caraterísticas, posturas, origens e
estatutos sociais semelhantes e semelhantes formas de ver a vida. Mantém-se um
grupo de amigos que se alarga. Tem tendência a fechar-se na sua zona de
conforto. O que fizerem fazem bem, em conjunto, mas terão pouca apetência para
inovar e arriscar.
A outra, porque aceita e integra
estranhos aos seus elementos, arrisca muito mais. Ganha em diversidade, mas tem
que construir mais laboriosamente a coesão que conseguir criar. Está sujeita a
mais erros de casting, mas aprende a lidar com eles e a superá-los sem
dificuldades de maior. Progressivamente vai alargando as origens sociais e
profissionais dos seus elementos. Tem uma maior diversidade de pensamentos
e de posturas em relação à vida e a todos os seus aspetos, opções políticas e
religiosas incluídas. Tem tendência a arriscar, a atirar-se para fora de pé.
Por vezes terá agradáveis sucessos. Outras suportará falhanços. Facilmente terá
dois, três ou quatro projetos em preparação ou execução, divididos por vários
grupos de obreiros da Loja. Convive muito bem com a diferença. Aprende a tirar
partido dela. Terá períodos muito gratificantes e períodos de desorientação,
pois o seu potencial criativo está no mesmo plano que o seu potencial de
desorganização. Será tudo menos aborrecida, mas pagará o preço de ser por vezes
inconsequente.
Vejamos
outro exemplo: uma Loja definiu uma linha de sucessão para a sua liderança e
segue-a, não tendo lutas eleitorais. Outra, pelo contrário, pratica a
democracia pura e dura, periodicamente se confrontando candidaturas e efetuando
escolhas.
A
primeira tem a vantagem de poder programar a prazo mais dilatado. Não gasta
tempo nem energias a sanar diferenças nem diferendos com origem em pugnas
eleitorais. Mantém uma certa continuidade no estilo da sua liderança. A
transição geracional é mais suave, mas muito mais prolongada. Quem chega tem de
esperar pela sua vez. A evolução da Loja tem tendência a ser lenta,
reproduzindo esta os hábitos consolidados. Ganha em estabilidade o que perde em
capacidade de adaptação rápida às mudanças.
A
outra está mais sujeita a conflitos, a cisões, a perdas de tempo com a gestão e
ultrapassagem das sequelas dos confrontos eleitorais. Tem tendência a súbitas
mudanças de estilo de liderança. Faz fáceis, rápidas e, mesmo, abruptas
transições geracionais. Chama à liderança os elementos que mais se destacam. A
evolução da Loja tende a ser rápida, com mudanças frequentes de hábitos,
estilos e posturas. Ganha em capacidade de adaptação o que perde em
estabilidade.
E
muitas outras variantes existem, combinando-se e recombinando-se, de forma a
gerar verdadeiras idiossincrasias típicas de cada Loja.
Cada
Loja é diferente, funciona de forma diferente e evolui de forma diferente. Cada
Loja comporta-se e efetivamente é uma uma família diferente das
demais. Mas, tal como as famílias biológicas educam as suas crianças e jovens e
fazem deles adultos válidos, tendo cada família a sua individualidade própria,
com as respetivas tradições, os seus hábitos e as suas formas de lidar com as
situações, assim também cada Loja ajuda à melhoria de cada um dos seus
obreiros, segundo as tradições que estabeleceu, os hábitos que criou e a sua
respetiva forma de trabalhar.
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