Escrito
por JPF
A Moral
O desejo de
perfeição nasce da ideia do perfeito
Mas só a ideia
pertence aos homens, as imperfeições são a assinatura do artífice, a rugosidade
da pedra, se bem que mínima conta a história daquele dia, daquele obreiro que
viveu aquela vida.
A obra perfeita
no entanto seria estéril, alheia ao homem que nasce, cresce e morre, não
contemplaria crescimento ou melhoramento, seria a morada ideal do ser completo.
Uma catedral
perfeita não poderia ter janelas ou escadarias, não poderia ser engrandecida
pela luz que por ela entra ou pelos fiéis que ocorrem.
Um obreiro é
aquilo que é, trabalha a pedra que possui em fraternidade com os seus irmãos,
com a ideia do sublime e do perfeito, inscrita em si, sabendo que ela pertence
ao eterno.
Mas fá-lo hoje,
com a pedra que possui, com a forma bruta que se lhe apresenta, não a ideal mas
aquela, e não há que esperar, eis o dia, e o ímpeto tem que ser mais forte que
todas as contrariedades.
É conduzido pela
moral que em si impera, e ela guia a mão, e a mão constrói o mundo, golpe a
golpe, pedra a pedra, sob a luz do céu estrelado que o conforta.
E as regras e
leis dos homens não o podem fazer esquecer quem é no âmago, as leis que o regem
universais e verdadeiras as linhas retas a simetria apurada.
Tudo o resto é
transitório como o vento que sopra, e pára, e volta a soprar na direção
contrária, mas a sua obediência é apenas estrita à confluência do interesse
superior pela humanidade. Pois o irmão não fere o seu irmão, não levanta a sua
mão contra o seu pai, na família universal a que pertence todos partilham o
mesmo pão e bebem do mesmo copo.
Exemplos
notáveis nos antecedem, luzes nos guiam e mostram a possibilidade.
Em 1955 a
menina, Rosa Parks, sentada num autocarro, ao não ceder um lugar a quem a favor
do direito mas contra a moral o achava merecer, elaborou a pergunta basilar:
Porquê a pedra
tem de ser bruta, porque não poderá ser afeitada, aproximar-se da perfeição
cúbica? Dessa pergunta surgiu a resolução, que a manteve estática e resiliente.
Esse primeiro golpe ténue mas vigoroso rachou a montanha, emprestou força a
quem lhe seguiu, e ecoa ainda hoje, reverbera como uma ação decisiva advinda de
uma obrigação moral para além da lei instituída, ela própria remetida ao
esquecimento.
Pouco mais de
uma década antes, num tempo e lugar tomados pela ausência completa da
racionalidade, sob um regime sanguinário, no entanto eleito, que por sua
determinação e apoiado num direito que o sustentava, ameaçava esmagar o mundo
como uma tenaz, um certo homem, consciente da sua fragilidade e mortalidade se
levantou contra tudo, o seu nome Aristides de Sousa Mendes, o cônsul sem medo,
sob as ordens que lhe exigiam o contrário imperou a moral que o iluminava, o
seu malhete e cinzel, um carimbo de borracha e uma almofada de tinta.
E quem naquele
tempo visse descontextualizado, falhava-lhe o milagre do que ali se passava,
não se aperceberia que os golpes que desferia, fosse em estações de comboio,
fosse em qualquer superfície improvisada, eram tão ténues e subtis, pois mal se
ouviam e quase pareceriam carecerem de eficácia eram no entanto de um vigor
incomparável, que em cada chispa arrancava almas à morte, perante ele a
realidade tornava-se outra, onde havia o espectro do fim nascia vida, nova
vida, uma a cada golpe do seu carimbo feito cinzel.
E a vidas
sucederam vidas, e o eco dos seus golpes ecoa em cada novo ser nascido dos seus
atos, hoje vivos e presentes.
A norma imposta
que tem em si a natureza da obrigação do homem perante outro homem, é
transitória manipulável e sujeita a interpretação, a moral advém da luz do
grande arquiteto vertida sobre os olhos dos seres de bem.
Toda a ação no
entanto comporta uma reação… sabiam bem estes homens e mulheres do destino que
abraçaram, fizeram-no com convicção e certeza, mas o medo no entanto não estava
ausente, sabiam que o preço da sua postura e altivez seria pago com lágrimas e
sangue, mas a obrigação fraternal de ver todos como irmãos e a impossibilidade
de virar costas à responsabilidade maior foi mais assertiva que tudo o resto.
Foram aquelas
pessoas naquele sitio, munidas do pouco que tinham que mudaram tudo, e que
ainda mudam, foi o esforço para além das barreiras da dor e do medo, foi a
impossibilidade de ser de outro modo, guiadas pela centelha dentro de si.
Foi esforço para
além do esforço, a superação, foi quem deu tudo o que tinha e mais ainda, para
que a luz não fosse obscurecida, para que na noite mais escura se vejam as
estrelas que indicam o caminho.
JPF -
Prancha de Companheiro
Muito bom!
ResponderExcluirBoa semana!
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