Ser Maçom sem
Sê-lo
Charles Evaldo Boller
É possível ser maçom sem sê-lo? A
pergunta é comum. Para o maçom é motivo de séria reflexão em si mesmo. Como
responderia o homem treinado nas coisas da Arte Real? Poderia formular o
seguinte raciocínio? - Já viu em algum lugar uma estátua representando uma
pessoa vigorosa portando um malho e um cinzel a esculpir-se de dentro de uma
pedra? Esta é a representação simbólica da auto educação da Maçonaria. Não é
fácil explicar o funcionamento do processo. Também não constitui segredo. Em
resumo a educação maçônica pode apenas ser vivida; é resultado de salutar
convivência. Para dar uma idéia superficial do que ocorre na Maçonaria é
interessante imaginar o homem em sua origem e de como ele provavelmente
construiu sua convivência social.
Na era do homem da caverna, quando o
sol se colocava no horizonte, acendiam-se fogueiras para aquecer, assar
alimentos e iluminar o ambiente. Ao redor destas fogueiras reunia-se a tribo.
Trocavam idéias do cotidiano, da caça, da colheita, dos perigos, e passavam
conhecimentos novos de uns para os outros. Nestas reuniões, pelo debate, por
conversas, em resultado de atos judicativos, e outras comunicações verbais,
cada um desejava sobressair-se ao outro com vistas a estabelecer sua vontade, e
principalmente, de obter a aprovação dos demais membros do clã, de
identificar-se. Esta necessidade de aprovação do grupo fazia com que o
indivíduo se adaptasse ao grupo e aceitasse códigos de ação e conduta que o
identificassem. Trocavam segredos, confidências de novas técnicas de caça e
truques para os mais diversos fins. Quem traísse tais segredos e os divulgasse
a outros de fora do grupo, no mínimo seria expulso do clã, quando não o
matavam. Isto foi usado por tanto tempo que acabou gravado indelevelmente nos
genes do homem, e assim, passa de geração para geração.
O indivíduo, ao forçar uma
modificação em si mesmo, às vezes até contra suas próprias inclinações,
praticava o que se faz numa loja maçônica; se auto-educava; é o que significa a
alegoria do escultor de si mesmo. O que ocorre dentro da loja é esta força do
grupo sobre o indivíduo. Há quem o designe uma força mística. Mágico mesmo é
quando se observam pessoas a se modificarem gradativamente para o bem, e isto
sem que elas o percebam. O grupo reunido é uma força poderosa para modificar
pessoas. - Somos seres sociais por excelência! Sociais porque o grupo exerce
uma força incrível sobre cada um de seus membros. Isto é verificável nos grupos
de jovens: usar "piercins", cortar cabelo de forma bizarra, tatuagem,
e outros sinais de identificação externa, são apenas algumas das modificações
forçadas pelos seus iguais. Transfira-se isto para características internas de
valores e princípios, espiritualidade, emoções e tem-se o que ocorre dentro de
uma loja maçônica. É por isso que não tem como aprender Maçonaria a partir de
livros; estes possuem apenas conhecimento, informação; e isto não é educação.
Para tal é necessária a convivência.
A escola que só transmite
conhecimento sem o aporte de princípios, valores e virtudes, não educa, e às
vezes sequer transmite conhecimentos. Transmitir conhecimento não é educação.
Informação serve quase que exclusivamente para prover o sustento. E como existe
apenas a auto-educação, cada um só muda quando decide e age para estabelecer
uma mudança. E quando esta alteração no seu eu (self) tem o apoio do ego (livre
arbítrio) tem-se a auto educação pura e proativa. É sempre orientada para o bem
porque a auto educação exige sempre sacrifício, sair da zona de conforto e partir
para a ação contra a tendência natural de aderir a vícios, exige força de
vontade hercúlea. Sozinho é difícil, mas não impossível. Em grupo a tarefa é
facilitada exatamente pela pressão advinda da reunião de diversas pessoas, da
energia do pensamento emitido pela coletividade; é genético. O estímulo vem
sempre dos irmãos maçons; membros do mesmo grupo social influenciam seus
iguais; é um provocando o outro para o bem. E como se tratam quais irmãos,
demonstram profundo amor entre si, o perfeito vínculo de união, é certo que
onde se reúnem, manifesta-se aquilo que conhecem pelo conceito de Grande
Arquiteto do Universo; espírito que permite reunir numa mesma sala pessoas das
mais variadas linhas de pensamentos e religiões para discutirem assuntos da
sociedade sem que se matem. É uma grande idéia; a maior herança que a Maçonaria
recebeu do Iluminismo Francês.
É possível ser maçom mesmo sem portar
avental, o símbolo do trabalho em si mesmo, da auto educação. O maçom sabe que
colocar um avental exige um tácito juramento, formal e sagrado, com trágicas e
sérias implicações para consigo mesmo se falhar. O simples fato de ser iniciado
na Maçonaria, de portar avental não gera um homem perfeito. Cada loja é a união
de homens imperfeitos, livres e de boa vontade, com uma vontade imensa de
buscar a perfeição, de se ver aprovado pelos iguais. A virtuosidade aflora
quando se entende o benefício da associação e de como empunhar as ferramentas
certas na auto educação. O dia-a-dia do maçom é tomado pelo salutar trabalho em
si mesmo; trabalha a pedra. Enquanto uma mão empunha o malho e golpeia com
força, a outra mão, conduzida pela razão, empunha firme e delicadamente o cabo
do cinzel. A ponta afiada do cinzel elimina gradativamente nódoas e excessos da
pedra imperfeita, revelando do interior da rocha disforme o homem aperfeiçoado,
exemplar obra de arte do Grande Arquiteto do Universo. Esta é a representação
do pedreiro esculpindo-se da rocha, é a representação da sua auto educação pelo
uso da razão equilibrada pela emoção e espiritualidade.
Então é possível tornar-se maçom sem sê-lo? Se
faltarem os camaradas de caminhada é difícil, mas possível. Existem muitos
homens que nunca viram o piso de um templo maçônico, são maçons sem avental
cujo comportamento probo e valioso para a sociedade os faz agirem quais
obreiros da pedra, faz deles membros da ordem maçônica sem formalizar sua
aderência pela iniciação. Quando identificados, a Maçonaria os convida a
fazerem parte da Instituição para reforçarem as colunas de seus templos, de somar
força com outros homens de igual disposição mental e espírito servidor da
humanidade. É o motivo da entrada na Ordem Maçônica ocorrer sempre em resultado
de um convite e não de vontade explicita do pretendente. É este acúmulo de
líderes sociais num só lugar a razão de com frequência ouvir-se que a meta de
todo maçom deveria ser o de acabar com a Maçonaria; fechar seus templos.
Utopia? Mas, e se todos os homens se tornarem perfeitos, qual será então a
utilidade da Ordem Maçônica?
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