Charles Evaldo Boller
Sinopse: O método de autoeducação da
Maçonaria; identificação de novos maçons para a Ordem; caminhos do humanismo;
valorização do pensamento lógico.
A Maçonaria "nada"
faz! Quem faz é o obreiro. E se ele assim o desejar. A Maçonaria, com sua
filosofia, doutrina, estrutura, enfim, com seu sistema, apenas apoia o processo
de mudança a que cada um se submete. Ilude-se o cidadão que entra na ordem
maçônica aguardando dela a ação de educá-lo; existe apenas autoeducação. Razão
de se afirmar que a Maçonaria não é "reformatório". O maçom já vem
pronto, cabe a ele utilizar-se do sistema da Maçonaria para melhorar-se, e isto
só é possível com árduo trabalho.
Na busca por novos, se
realmente se desejar que a ordem mude no aspecto de albergar em suas colunas
homens de escol, que façam a diferença, deve-se prospectar por aqueles que já
são "maçons" quando profanos. Iniciação é formalidade. Tais homens
são imberbes no que diz respeito aos ritos e a doutrina maçônica; o objetivo é
fazer estes homens ainda melhores que já são. O que atua para mudar tais bons
homens para melhor? É a convivência com outros homens de semelhante
característica e determinação. É da convivência, do constante roçar de uns nos
outros em termos intelectuais e é abordando problemas da sociedade que se
propicia a possibilidade de aportarem insights que possam mudar a sociedade
pelo desenvolvimento do humanismo. O maçom não vai mudar os outros homens da
sociedade, longe disso, é falácia dizer que o maçom deve voltar para a
sociedade e mudar criaturas brutas e abestalhadas que lá se encontram em
resultado de suas lides materialistas, oportunistas e viciadas. O bom homem que
adentra às portas do templo vai melhorar a si mesmo; e só! Quanto mais
personalidades adentrarem nesta sublime instituição por amizade e politicagem,
em detrimento de qualidades que o revelem "maçom" ainda não iniciado,
pior fica o ambiente, corrompem-se relacionamentos, situações surgem onde a
tolerância é colocada à prova, até o momento em que a própria tolerância fenece
e surge tirania.
O insight da afirmação a
respeito do "nada" que a Maçonaria oferece tem por base a conhecida
resposta de Pitágoras momentos após sua iniciação; ele teria dito: -
Simplesmente nada encontrei! - E que depois disso partiu em busca do
significado deste "nada". É o que o maçom deve fazer na Maçonaria,
buscar respostas deste "nada". Ao maçom cabe reunir-se com outros
maçons que igualmente buscam escapar por alguns instantes da semana do mundo
dos desejos e das ilusões e desenvolver sabedoria. Isto pode ser um excelente
exercício discursivo se remanescer apenas no plano das ideias, retórica que
nada constrói de prático sem o concurso de exemplos e a influência do grupo
social. O homem, criatura social por excelência, carece da convivência, do
elogio, da aprovação, da continua provocação para melhorar-se. O maçom usufrui
de convivência, emoção, amizade, para mudar a si mesmo no processo de
autoeducação onde atua a doutrina maçônica.
Muitos se afastam das lojas
porque os maçons lá recebidos nada encontram para dar respostas ao
"nada" que trazem em si. Encontram "nada" porque a maioria
dos que deveriam ser seus iguais, "nada" portam igualmente e
"nada" trocam com ele. Em todo canto encontram-se maçons que com
empáfia falam de simbolismo do alto de suas "cátedras" quando sequer
entendem o significado do compasso e os sucessivos círculos concêntricos que
com ele podem ser produzidos; os infinitos pensamentos. Limitam-se os maçons
iniciados a repetir rituais automáticos e muito bem ensaiados sem lhes
determinar o sentido, a doutrina maçônica. Sentem que participam de associação
de amigos que se reúnem para comer macarrão e churrasco, tomar cerveja e
verbalizar causos do cotidiano. Fica pior quando as sessões arrastam-se monótonas
e sem gosto, onde fica evidente a perda de tempo. Como uma sessão sem atividade
intelectual pode corroborar para o desenvolvimento do maçom? Trabalhos são
lidos e mal discutidos. Instruções são lidas e não interpretadas passo a passo.
Quando surge expoente entre os aprendizes, sua capacidade de participação é
desprezada por aqueles que se assenhoraram da verdade absoluta e se consideram
donos destas; ou desestimulam o aprendiz com frases de efeito; quando ignoram
questionamentos, fazem troça e dizem que ele vai aprender isto em graus
superiores; estes manifestam o "nada" de que são constituídos.
O materialista questiona: -
Como nada? Não vê os adornos do templo, ferramentas e estrelas no teto? O maçom
torto apenas vê o esquadro e não imagina que aquele significa retidão de
proceder; talvez o saiba, mas não o coloca em prática em sua vida e logo o
esquece. Porque faz assim? Porque não era "maçom" antes de ser
iniciado.
Um ponto de entrada na
doutrina maçônica é a capacidade de abstração para converter o simbolismo em
raciocínios práticos e os colocar em uso na vida. Para isto ocorrer com
eficiência concorre elevada capacidade espiritual. Não há necessidade de ser
acadêmico! O simbolismo é simples, mas é preciso pensar, trabalhar e entender.
Observa-se que os melhores maçons são em sua maioria pessoas humildes que
debatem com ardor ideias novas sem se ferirem. São aqueles que alimentam seus
pensamentos com novas ideias de forma permanente, que afiam suas espadas, suas
línguas, em exercícios de retórica refinada para convencer seus pares de suas
ideias e do que é objeto da sua mais alta aspiração. Que escrevem com denodo e
capricho peças de arquitetura para transmitir com clareza seus pensamentos aos
outros. Que permanecem calados quando percebem que o outro demonstra verdades
de outra forma e ótica que a sua.
Pensar de forma proativa é
raro entre os entorpecidos pela preguiça de estudar, pensar e que balbuciam
palavras desconexas e repetitivas semelhante ao rito. Rito é repetição,
pensamento não! E é divertido brincar com pensamentos! De todas as propostas de
iniciação que li em minha loja simbólica, li a maioria das que remanescem nos
arquivos, os maçons iniciados buscam na Maçonaria condição de aperfeiçoamento.
A intensão pode estar velada por motivos estritamente materialistas, encontrar
protetores ou ganhar mais dinheiro, mas no papel registraram em sua maioria que
desejam melhorar. Outros, no andar da carroça, enquanto as abóboras vão se
acomodando, despertam em si os mais elevados sentimentos humanistas. Depois que
a curiosidade está alimentada é necessário ingerir novos alimentos mentais,
cada vez mais consistentes, senão desaparece o interesse. Cabeça vazia é
oficina do diabo!
Outra falácia imposta pela
errônea interpretação e uso de antigos maçons é o que deve ser mantido em
segredo para o não iniciado. O cidadão bate às portas do templo sem conhecer
rudimentos do que o espera - e isto segue adiante nos graus filosóficos. Alguns
aguardam da realidade maçônica a consecução de ilusões díspares, inadequadas,
absurdas. Maçonaria não é reformatório nem atende às ilusões dos homens nem é
remédio para ilusões. É possível criar mais expectativa por revelar detalhes e
comportamentos do maçom, o que é Maçonaria e de como ela funciona, sem revelar
segredo algum. Na Grande loja do Paraná é usual entregar um livreto ao
pretendente, mas ainda é pouco.
Já vivenciei cerimonia de
iniciação que mais parece trote universitário que reflexão da gravidade e
sacralidade do ato de morrer para uma condição anterior. O cidadão é iniciado,
mostram-lhe ferramentas e determinam que trabalhe na pedra bruta. Se trabalhar
recebe aumento de salário, se não, recebe também. O que se vê com frequencia
são peças de arquitetura toscas, meras cópias de rituais e textos obtidos na Internet
e livros de origem duvidosa. É feita a leitura, o vigilante pede aumento de
salário e pronto! O maçom ascende um grau. Chega à plenitude da Maçonaria
simbólica e nada desenvolveu da doutrina contida nos rituais. Não aprendeu a
pensar e interpretar a doutrina da Maçonaria. A base é a doutrina o rito a
ferramenta. Doutrina exige pensar, rito é repetição mecânica, provocação ao ato
de pensar. Os aprendizes não pensam porque seus pares também não o fazem; não
debatem, não analisam, não debulham os meandros das ideias desenvolvidas ou
copiadas pelo irmão. Copiar não é pecado, o erro está em não pensar e detalhar
o que se copiou. E se o oficial resolve endurecer já apontam padrinho e outros
irmãos a demovê-lo de seu intento: - Não faça isso, você vai espantar o
obreiro. São realidades que confrontam o novo irmão com o mesmo
"nada" que o levou a pedir a luz. É lógico que procure motivos
urgentes para despedir-se.
Qual o motivo dos maçons não
oportunizarem o trabalho no campo do pensamento. Preguiça? Ou seria porque
trabalho carrega em si conotação de negação do ócio, de castigo? O maçom
operativo trabalhava de sol-a-sol em atividade que lhe rendia momentos de
êxtase e concretização de belezas, algumas delas constante de arte fútil, mas
que rendia prazer. Cada pedreiro preocupava-se com o detalhe que tinha a seu
cargo, a pedra que esculpia; dificilmente olhava a obra inteira, mas sabia que
trabalhava na construção de uma catedral; o pedreiro especulativo olha apenas a
sua pedra, ele mesmo, sem olhar para o resto da sociedade, que é a catedral da
qual faz parte. É só olhar para imagens das catedrais erigidas por aqueles
vetustos profissionais para deduzir que a maior parte daquele árduo trabalho
era desnecessária, mas era arte; igualmente o especulativo deve desenvolver
atividade que lhe dê prazer, arte, diversão pelo pensamento.
Dizer para um irmão que ele
deve produzir trabalho intelectual reflete nele com conotação de escravidão,
tarefa a ser realizada para satisfazer necessidades fisiológicas ou atender a exploração
do sistema. Muitos não veem a hora de sair do templo, olham o relógio com
frequência, para dirigirem-se ao bar para "tomar umas e outras" e
"jogar conversa fora". Não poderiam canalizar este "jogar
conversa fora" para debates de temas úteis em direção ao humanismo e assim
mesmo desfrutar prazer? O homem de hoje procura prazer imediato sem ter de
investir. Poucos destilam prazer do trabalho. Os objetivos das sessões devem
ser tais que transformem trabalho em momentos de ócio criativo, assim como explicado
por Domenico de Masi e Bertrand Russell. O maçom, o homem de hoje não entende
como alguém pode desfrutar prazer no trabalho. O trabalho em loja deve se
converter em diversão; deve ser encarado como um imenso playground do
pensamento para tornar-se agradável e atrair os irmãos reiteradas vezes às
atividades intelectuais.
Defendo a ideia de
transformar as reuniões em encontros prazerosos e ao mesmo tempo edificantes,
sem prejudicar o rito. Como descobrir a veia artística de cada maçom em loja e
ao mesmo tempo conduzir as atividades para aprimorar o humanismo? Temos necessidade
de compreender o que existe escondido nos ritos e transformar isto em atividade
prazerosa, algo que resulte em satisfação; atividade criadora assemelhada ao
trabalho dos antigos pedreiros da guildas.
Que as sessões não sejam
apenas um amontoado desconexo de palavras e sim prateleira organizada de
pensamentos e ideias. Que o "nada" ceda lugar ao desejo de participar
cada vez mais. Que cada sessão fique com aquele gostinho de "quero
mais", onde os próprios debatedores e participantes solicitem prolongamento
dos trabalhos com vistas a aumentar o prazer desfrutado para convivência
prazerosa na obra do grande templo da sociedade. Desenvolver o gérmen de algo
inusitado para preencher o "nada" de cada um deve ser a mola mestra
das atividades. Como fazê-lo? É simples, nivele a loja e coloque os irmãos a
debater temas onde eles próprios são as personagens; onde eles possam
solucionar a angústia de preencher o vazio do "nada" que portam e com
isto justificar o dom do livre-arbítrio atribuído pelo Grande Arquiteto do
Universo as suas criaturas e com isto dar glória para obra criativa.
Bibliografia:
1. BEHRENS, Marilda
Aparecida, Paradigma da Complexidade, Metodologia de Projetos, Contratos
Didáticos e Portfólios, ISBN 85-326-3247-5, primeira edição, Editora Vozes
Ltda., 136 páginas, Petrópolis, 2006;
2. BRASIL, Supremo Conselho
do Grau 33 do Rito Escocês Antigo e Aceito para a República Federativa do,
Ritual do Grau 15 do Rito Escocês Antigo e Aceito, Cavaleiros do Oriente, da
Espada e da Água, Segunda Série de Graus Históricos e Capitulares, primeira
edição, Supremo Conselho do Grau 33 do Rito Escocês Antigo e Aceito para a
República Federativa do Brasil, 64 páginas, Rio de Janeiro, 1925;
3. CAPOZZI, Carmo, A Luva e a
Alma, primeira edição, Agnes Gráfica e Editora, 96 páginas, São Paulo, 2008;
4. CAPRA, Fritjof, A Teia da
Vida, Uma Nova Compreensão Científica dos Sistemas Vivos, título original: The
Web of Life, a New Scientific Understandding Ofliving Systems, tradução: Newton
Roberval Eichemberg, ISBN 85-316-0556-3, primeira edição, Editora Pensamento
Cultrix Ltda., 256 páginas, São Paulo, 1996;
5. CHALITA, Gabriel, Os Dez
Mandamentos da Ética, ISBN 85-209-1584-1, primeira edição, Editora Nova
Fronteira S/A, 224 páginas, Rio de Janeiro, 2003;
6. SEMLER, Ricardo, Virando a
Própria Mesa, Uma História de Sucesso Empresarial Made in Brasil, ISBN
85-325-1348-4, primeira edição, Editora Rocco Ltda., 232 páginas, Rio de
Janeiro, 2002.
Biografia:
1. Fritjof Capra, autor,
físico e teórico de sistemas. Nasceu em 1 de fevereiro de 1939. Com 71 anos de
idade;
2. Pitágoras ou Pitágoras de
Samos, filósofo e matemático de nacionalidade grega. Nasceu em Ásia Menor em 26
de novembro de 582 a. C. Faleceu em 500 a. C. Fundador da Escola de Crotona,
responsável pela criação dos números irracionais e do Teorema de Pitágoras;
3. Ricardo Semler, autor e
empresário de nacionalidade brasileira. Nasceu em São Paulo, São Paulo em 1959.
Com 51 anos de idade. Presidente da SEMCO S/A.
Data do texto: 09/01/2011
Sinopse do autor: Charles
Evaldo Boller, engenheiro eletricista e maçom de nacionalidade brasileira.
Nasceu em 4 de dezembro de 1949 em Corupá, Santa Catarina. Com 61 anos de
idade.
Loja Apóstolo da Caridade 21
Grande loja do Paraná
Local: Curitiba
Grau do Texto: Aprendiz Maçom
Área de Estudo: Filosofia,
Maçonaria, Ritualística, Tolerância
Nenhum comentário:
Postar um comentário