O ORADOR
Escrito por Rui Bandeira
O
Orador é o guardião da Tradição Maçónica e zelador pelo cumprimento das leis e
regulamentos em Loja, pela Loja e pelos obreiros da Loja. Integra, com o
Venerável Mestre e o 1.º Vigilante, a Comissão de Justiça da Loja. É o único
obreiro que pode interromper qualquer outro obreiro, incluindo o Venerável
Mestre, quando se lhe afigure necessário para assegurar o cumprimento dos
princípios, leis ou regulamentos maçónicos. Não admira, assim, que a medalha do
Orador seja constituída por uma imagem das Tábuas da Lei.
O
Orador é um ofício específico do Rito Escocês Antigo e Aceite, que não deve ser
confundido, por exemplo, com o ofício de Capelão em outros ritos. Com efeito, o
Orador é o oficial da Loja que tem, além da anteriormente referida, a função
ritual de proferir Orações. Mas isso não quer dizer Preces... A Oração
proferida por este Oficial da Loja é de outra natureza: o Orador tira, de cada
debate, as suas conclusões e nisso deve consistir a Oração final (no sentido de
"intervenção oral") que lhe compete produzir. Assim, compete ao
Orador, no final de cada debate, resumir e organizar as várias posições que
tenham sido expostas e, em função das mesmas dar o seu parecer ao Venerável
Mestre sobre a decisão a tomar e a forma como deve ser tomada.
Recorde-se
que o debate em Loja processa-se segundo regras rígidas, tendentes a
possibilitar a livre expressão da opinião de cada um, sem constrangimentos nem
perturbações. Importa a substância do que é transmitido, não a sua forma.
Debate-se, no sentido de se analisar uma questão e tomar uma decisão; não se
discute para procurar fazer valer a sua opinião, para levar de vencida
opositores (pois em Loja não há opositores, apenas Irmãos que cooperam) ou
rebater argumentos. Em Loja, o debate estabelece-se sempre relativamente a uma
questão concreta, em relação à qual cada Mestre deve proceder à sua análise,
dar a sua opinião, apresentar o seu entendimento da melhor forma de proceder.
Cada Mestre intervém uma e só uma vez em cada debate. Não se interrompe ninguém
(o único que pode fazê-lo, e unicamente para salvaguarda dos usos e costumes,
leis e regulamentos maçónicos é precisamente o Orador - e esta situação só
raramente ocorre). Cada Mestre só inicia a sua intervenção após estar terminada
a intervenção anterior e depois de devidamente autorizado a fazê-lo pelo
Venerável Mestre. Em caso algum se estabelece diálogo: cada Mestre fala para
toda a Loja, não para uma pessoa em particular. Cada um dá a sua opinião sobre
o tema, não gasta o seu latim e a paciência dos demais a refutar ou criticar
outras opiniões anteriormente expressas: a assembleia é composta de homens
inteligentes, que facilmente podem discernir que se A entende branco e B
amarelo, B não concorda com A e tem uma opinião diversa dele - não vale a pena
afirmá-lo expressamente. A mera expressão da fundamentação da sua opinião chega
para mostrar a todos as concordâncias e discordâncias com intervenções
anteriores. Em resumo, em Loja não se diz "não concordo com...",
declara-se "o meu entendimento sobre o assunto em debate é este, por estas
razões").
O
Orador efetua o resumo do debate com o máximo de objetividade possível e coloca
em relevo o sentir da Loja, o que resultou do debate. Ao fazer o resumo, o
Orador evidencia se se verificou uma posição unânime, e em que sentido, se se
manifestaram entendimentos diversos, mas um deles foi largamente maioritário, e
qual, se há diversos entendimentos, sem que se tivesse destacado uma posição
largamente maioritária, ou se o debate não foi conclusivo, por falta de
elementos ou de opiniões consolidadas sobre a questão em análise.
Feito
o resumo do debate, o Orador tira a sua conclusão, isto é, o parecer, a
recomendação, que transmite ao Venerável Mestre sobre a decisão a tomar. A
conclusão do debate tirada pelo Orador nada tem a ver com a posição pessoal que
porventura tenha. Assinala se houve unanimidade ou, pelo menos, uma posição
largamente maioritária - e, nesse caso, recomenda que o Venerável Mestre decida
em conformidade com o sentido expresso pela Loja, sem necessidade de votação - ou
indica as posições expressas que, não sendo evidente uma tendência largamente
maioritária, devem ser colocadas à votação pela Loja. O enunciar dessas
posições deve ser claro e inequívoco, para que a Loja, ao votar, saiba
exatamente o que está em causa na escolha que vai fazer. Quando tal se
justifique, seja por das intervenções ressaltar a falta de elementos
suficientes para uma decisão devidamente fundamentada, seja por se notarem mais
dúvidas do que certezas, o Orador deve recomendar o adiamento da decisão,
sugerindo as diligências a efetuar para possibilitar, em devido tempo, uma
decisão mais esclarecida.
Note-se
que o Venerável Mestre não está obrigado a decidir em conformidade com as
conclusões do Orador. Pode discordar e decidir em sentido diferente, formal ou
substancialmente. É o Venerável Mestre aquele a quem a Loja delegou o exercício
da autoridade. O Orador é - sempre - um colaborador, um auxiliar, do Venerável
Mestre, nunca uma eminência parda que se lhe imponha. E isto mesmo até quando o
Orador, no uso da sua competência de guardião da Tradição Maçónica e zelador
pelo cumprimento das leis e regulamentos, porventura chame a atenção do
Venerável Mestre para uma infração ou falha que se esteja em vias de cometer.
Ainda assim, o poder de decisão final é do Venerável Mestre e só do Venerável
Mestre. Se errar, é ele quem erra e é ele que assume a responsabilidade do
erro. Ao Orador compete avisar, não pretender sobrepor uma sua inexistente
autoridade à única que vigora em Loja.
No
final da sessão, após ter sido concedida a palavra a bem da Ordem ou da Loja (o
que, em reuniões profanas corresponde ao "período depois da Ordem do
Dia"...), o Orador tira as suas conclusões sobre a reunião. Não se trata
aqui de sumariar as intervenções a bem da Ordem ou da Loja, porque estas, ou
são meramente informativas ou, se carecerem de deliberação, são apenas
introdutórias de um debate a efetuar em sessão futura. Trata-se de sumariar o
que foi feito e deliberado na sessão. Este breve sumário, para além de
evidenciar o trabalho realizado, facilita a tarefa do Secretário de elaboração
da ata da sessão, a ser aprovada na reunião seguinte.
É
também frequente que o Orador, nas suas conclusões finais, apresente uma
(breve, muito breve) Prancha Traçada sobre um tema maçónico, preferentemente
relacionado com o que se tratou na sessão em causa. Porém, tal NUNCA sucede
quando na sessão tiver sido apresentada uma outra Prancha Traçada por um
Mestre. Em cada sessão de Loja deve haver formação dos obreiros, deve ser
apresentado, em contribuição para o trabalho de aperfeiçoamento dos obreiros,
um trabalho, uma exposição, um estudo - em resumo, uma Prancha Traçada. É
incumbência, dever, dos Mestres da Loja garantirem-no. Se o não fizerem, estão
a prejudicar a aprendizagem e a integração dos Aprendizes e Companheiros e a
própria evolução pessoal dos Mestres. Mas apenas deve ser apresentada e
colocada à meditação da Loja uma única Prancha Traçada de Mestre. Mais do que
isso, seria estabelecer a confusão. Um tema para meditação e estudo por sessão
é o necessário e o suficiente. Assim, se nessa sessão, tiver sido apresentada
por um Mestre uma Prancha Traçada, a conclusão final do Irmão Orador
resumir-se-á ao sumário dos trabalhos (incluindo a referência a essa Prancha
Traçada, obviamente). Se tal não tiver sucedido, incumbe ao Orador, Mestre que
efetua a última intervenção formal antes do encerramento dos trabalhos,
garantir que a Loja não fique sem matéria para estudo e meditação, através
então de uma brevíssima Prancha Traçada, em que, mais do que ensinamentos ou
proposições, deve levantar pistas para reflexão. Assim, ficam os trabalhos
justos e perfeitos!
Rui
Bandeira
Nenhum comentário:
Postar um comentário