A ÚLTIMA EXPERIÊNCIA (2a Parte).
Autor: Dilson C. A. de Azevedo
(2ª Parte)
“Um dia, no fim do conhecimento das coisas,
abrir-se-á a porta do fundo e tudo o que fomos – Lixo de Estrelas e de Almas –
será varrido para fora da casa.”
Bernardo Soares –
Heterônimo de Fernando Pessoa (1888-1935), poeta português.
Livro do Desassossego.
“Trazei pajens; trazei,
virgens; trazei, servos e servas, as taças, as salvas e as grinaldas para o
festim que a Morte assiste!
Trazei-as e vinde de
negro, com a cabeça coroada de mirtos.
Vai o Rei a jantar com a Morte, no seu palácio
antigo, à beira do lago, entre as montanhas, longe da Vida, alheio ao Mundo.”
Bernardo Soares
Livro do Desassossego.
O encontro com a
Indesejável das Gentes (designação por Manoel Bandeira; 1886-1968; poeta
brasileiro) caracteriza-se por ser inevitável e imprevisível.
Diziam os antigos:
“Morte certa, hora incerta”.
Um homem preocupado com
isso, fez um trato com a Morte, para que fosse avisado com antecedência sobre o
momento em que deixaria o Mundo.
Começaram então a
falecer familiares e amigos, até que ele também percebeu que iria adentrar ao
Reino de Hades.
Ao ver a lúgubre
Senhora, com o seu manto negro, garras de harpia, segurando uma foice,
revoltado ele lhe perguntou: não acertamos que eu fosse bem antes avisado?
Ela respondeu-lhe: e o
desaparecimento dos seu parentes e amigos não foi o suficiente?
Pode acontecer que o
desenlace individual seja lento e previsível. Neste caso é importante para
maior tranquilidade ao que se despede da Vida, que siga as recomendações de:
agradecer a todos os familiares, pedir desculpas pelas faltas cometidas,
manifestar amor aos que ficam, despedir-se convenientemente (orientações da
psiquiatria suíça Dra. Elisabeth Kubler Ross; 1926-2004).
Sabe-se que, ao mesmo
tempo, somos Mortais e Eternos, e em nosso corpo físico Vida e Morte coexistem.
Ingressamos neste mundo
em que existe a dualidade (bem, mal; dia, noite, etc) através de uma inspiração
e o deixaremos após uma última expiração.
Assim, por nossos
movimentos respiratórios (10 a 15 vezes por minuto), mesmo sem o percebermos,
estamos simbolicamente nascendo e morrendo, enquanto interagimos e vivenciamos
experiências diversas. Como falou Goethe (1794-1832; escritor alemão): “Tudo
que sei custou as dores das experiências”.
Em nosso sangue (4
litros, no adulto; 7% do peso do corpo), são destruídos (e não tomamos conhecimento
disso), um trilhão de glóbulos vermelhos por dia, e pelo fenômeno de Apoptose
(morte celular programada, e sob controle genético), descamam diariamente
milhões de células da epiderme (camada visível da pele 2 m2 de
extensão; maior órgão do corpo) possibilitando a sua renovação.
Na Mitologia
Greco-Romana, existe referência a três irmãs (Moiras ou Parcas): uma que tecia
o fio da Vida, outra que determinava-lhe o tamanho e a terceira que o cortava:
Cloto, Laquesis e Atropos.
Coincidentemente, na
biologia celular conhece-se uma estrutura nas extremidades dos cromossomos
denominada telômero, que vai diminuindo nas divisões das células chegando a um
limite que dificulta a divisão celular, a qual permite a Vida. A propósito já
foi descrita uma rara doença genética denominada Progéria caracterizada por
envelhecimento físico precoce, sendo uma das etiologias aventadas a perda das
extremidades dos telômeros, levando a morte por volta dos 16 anos de vida.
Foto crianças com
progéria
A expectativa da
existência humana está ligada à melhoria das condições econômicas higiênicas e
médicas da população. Atualmente no Japão encontra-se por volta dos 86 anos.
Em alguns casos, porém,
sabe-se que a Vida Humana pode ser extensa. A Sra. francesa Jeanne Calment
(1875-1997) foi a mulher que comprovadamente teve a vida mais longa da
História: 122 anos e 164 dias.
A Criação e Destruição
estão sempre presentes em Nosso Universo. Está até previsto, astronomicamente,
que nosso planeta será um dia destruído pelo Sol, e nossa Galáxia (Via Láctea)
colidirá com aquela de Andrômeda.
Em relação aos Seres
Humanos, Nascimento e Morte são os aspectos a considerar, pois a Energia que
nos constitui é absoluta, eterna.
A inexorável ocorrência
da Morte, poder sobre o qual não temos controle, pode ser adiada através de
cuidados relatados a seguir: consultar o médico periodicamente, manter
atualizadas as vacinas, fazer exercícios físicos, alimentar-se de modo saudável
em pequenas porções (mais vegetais, menos carne vermelha), cultivar o
equilíbrio psíquico e pessoal, lembrar-se de sorrir pois isto libera endorfinas
(diminui a dor) e serotonina (aumenta o bem estar); ter um objetivo na vida, e
cultivar de modo equilibrado altruísmo e bondade.
Um recurso simples para
nossa saúde reconhecido pela Medicina, é a Meditação, prática com mais de 5 mil
anos, e que não tem nada a ver com a Religião.
Ela acalma a mente e
permite até lampejos de autoconhecimento.
Tal procedimento entre
outros benefícios diminui: os batimentos cardíacos, a pressão sanguínea, os
movimentos respiratórios e consumo de oxigênio. Reduz também a frequência das
ondas elétricas cerebrais que estão relacionadas a diferentes estados de
consciência, sendo que por ex. as ondas beta estão ligadas ao estado de vigília
(atenção voltada ao mundo exterior) e as ondas alfa ao relaxamento (mundo
interior). Ocasiona ainda esta atividade uma diminuição da tensão muscular e
nível de adrenalina (que aumenta em situações de estresse provocando
taquicardia e tremores).
Pode ser feita em
qualquer lugar silencioso, duas vezes por dia, preferencialmente no mesmo
horário, iniciando-se com cinco até chegar a 30 minutos. Deve-se usar roupas
folgadas, sentar-se (não deitar-se, o que favoreceria o sono) deixar a
mandíbula relaxada, manter a coluna ereta (facilita o fluxo de energia no corpo
e evita tensão muscular) colocar as mãos sobre as coxas, pernas separadas,
fechar os olhos e prestar atenção na inspiração e expiração.
Convém manter a atenção
em um ponto entre as sobrancelhas, região da glândula pineal, segundo René
Descartes (1596-1650) sede da alma, e atualmente entendida como um transdutor
de freqüências energéticas.
Essa prática poderia em
pessoas com boas condições de saúde, ser precedida por outro exercício para
aliviar o estresse: a ioga do hálito de fogo (Lama Surya Das): respirar fundo
enchendo por completo o abdômen; então soltar o ar pela boca com um grande
suspiro de alívio. Repetir estas respirações 7 ou até 21 vezes.
A Morte permite
biologicamente a evolução e renovação do que existe. Sendo ela universal e
implacável, cria a igualdade de entre os seres humanos e nos ensina a humildade
e o desapego.
Ela nos conscientiza de
não desperdiçarmos a Vida, e para alguns religiosos de evitar consumir o tempo
que temos gerando situações que retardem atingirmos o nosso destino final: o
Numinoso, o Transcendente.
Sobre os pontos de vista
acima convém lembrar o que falou D. Hillenbrand:
“Não é uma questão de
poder ou não poder, é uma questão de fazer ou não fazer. Tudo é escolha;
escolha com sabedoria.”
O aspecto numinoso
constitui em algo muito importante e pode ser associado ao Mito de Sísifo,
mortal astuto e inescrupuloso que buscava apenas o prazer na Vida. Para isso
conseguiu aprisionar a Morte, esvaziando o Reino de Hades (Plutão) nas
vastidões do Érebo (mundo dos mortos).
Zeus então condenou-o a
rolar uma pedra colina acima, a qual sempre descia, começando tudo de novo.
Perdeu ele então a
possibilidade de prosseguir em seu destino.
Ensina à respeito o
Prof. Viktor D. Salis: esse é o sentido e o destino daqueles que estão presos
ao material e à busca incessante do prazer como um fim em si mesmo: estão
condenados a permanecer sempre no mesmo lugar, estão rolando uma pedra sem
sentido, e só eles não foram avisados”.
Assim urge em vida
desenvolvermos qualidades humanas; cultivarmos o que de mais nobre exista em
nós, deixando uma marca no mundo por menor que seja, um exemplo aos demais, não
vivendo em vão.
Cite-se a respeito o
caso do milionário e químico sueco Alfred Nobel (1833-1896) inventor da
dinamite, explosivo à base de nitroglicerina.
Ele ficou chocado por
ocasião da morte do seu irmão, quando um jornal francês, colocou erroneamente o
seu obituário, chamando-o “mercador da morte”.
Refletindo sobre isto
ele resolveu criar uma Fundação com o seu sobrenome, destinada a promover
prêmios (Prêmio Nobel) aos que contribuíssem para o progresso da Humanidade.
Grande parte dos homens,
entretanto, tendem a ser desequilibrados, egoístas , gananciosos, onipotentes,
predadores do meio ambiente.
O panorama seria mais
aterrorizante, não fosse o trabalho secular das Religiões ou Organizações como
a Maçonaria, que une indivíduos bons e selecionados, para o aperfeiçoamento
pessoal, e com isto torná-los ótimos construtores sociais.
As grandes potências
mundiais, que lamentavelmente, tem apenas interesses econômicos, vivem
indiferentes a tragédias que ainda ocorrem, como por exemplo, na Somália, onde
milhões de pessoas morrem de fome, pois o país não tem agricultura e sua pesca
foi prejudicada por ações predatórias de países europeus, os quais usam as
praias desta nação africana como depósito de lixo hospitalar e material
radioativo.
Preferem estes países
desenvolvidos investir em seus poderios bélicos, já suficiente para extinção da
Humanidade, a demonstrar preocupação com estes seres em condições adversas.
Não se trata aqui de
paternalismo, porém de promover, na medida do possível a prática da justiça, do
respeito, do amor, valores que contribuem para um mundo melhor. Afinal viemos
de uma única fonte, somos um em nível de essência, e se uma parte de nós está
sofrendo, e não é aliviada, as demais, até em proveito próprio, devem ter a
coragem de abandonar a indiferença e restabelecer a harmonia no todo.
Uma ação mundial, por
mínima que fosse em países subdesenvolvidos reduziria a ignorância, o
fanatismo, o terrorismo, e as ações predatórias contra os mais afortunados.
Diga-se, a propósito,
que alguns Somalis praticam a pirataria em sua costa marítima.
Lixo hospitalar em praia
na Somália
Fome na Somália
Em povos vivendo estas
experiências terríveis, o instante da morte, em que os seres humanos, partem
com as mãos vazias não obstante serem ricos ou poderosos, constitui-se em
momento de felicidade, como descreveu a poetisa portuguesa Florbela Espanca
(1894-1930):
“Morte, minha Senhora
Dona Morte, tão bom que deve ser o teu abraço!
Lânguido e doce como um
doce laço e, como uma raiz, sereno e forte.
Não há mal que não sare
ou não conforte
Tua mão que nos guia
passo a passo,
Em ti, dentro de ti, no
teu regaço,
Não há triste destino
nem má sorte.
Dona Morte dos dedos de
veludo,
Fecha-me os olhos que já
viram tudo
Prende-me
as asas que voaram tanto!
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