O
EMPREGO
Hilário Silva
O irmão Antero Silva era apaixonado por
perfeição.
Exigia limpeza, bom-senso, equilíbrio e harmonia
em tudo.
Decerto por isso, em na mansão familiar, vezes e
vezes, afirmava aos amigos:
- Não acredito que Deus apoie as pessoas erradas.
Se uma criatura cai em falta, estará naturalmente marcada para que ninguém lhe
dê serviço
Aconteceu que houve falta de braços em sua casa e
o nosso amigo apressou-se em anunciar uma vaga de arrumadeira, explicando,
porém, que a candidata deveria apresentar os melhores antecedentes, em relação
aos dez anos últimos.
De posse do jornal que continha a notícia, certa
moça tristonha, no dia seguinte, lhe bateu à porta.
Silva chamou a esposa para atendê-la e a senhora,
conhecendo a austeridade do marido, iniciou o interrogatório de estilo:
- Onde esteve você nos dez anos últimos?
- Senhora – falou a interpelada – nos últimos dez
anos, não saí de casa.
E o diálogo prosseguiu:
- Você fuma?
- Não.
- Costuma beber algum alcoólico?
- Também não.
- Tem frequentado bailes e boates?
- Nada disso.
- Nestes dez anos passados, terá ido a encontros,
especialmente à noite para entretenimentos afetivos?
A moça, evidentemente incomodada com tantas
indagações, respondeu, em tom quase áspero:
_ Não senhora. Eu já disse que, em todo esse
tempo, não me ausentei de casa...
Nesse ponto do entendimento, o irmão Silva que
acompanhava a conversa, entrou no assunto e perguntou:
- Afinal, quais são os seus antecedentes, no tempo
a que nos referimos? Poderá, porventura, permitir-me uma vista de olhos em seus
documentos?
- Perfeitamente.
Silva desenrolou os papéis que a
interlocutora lhe apresentou e, só então, ficou ciente de que a candidata ao
emprego, saíra, na véspera, de uma pena de dez anos que lhe fora determinada na
Casa de Correção.
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